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Um abraço em Jesus.

segunda-feira, 5 de março de 2012

Gravissimum Educationis- Importância Capital da Educação





DECLARAÇÃO GRAVISSIMUM EDUCATIONIS
SOBRE A EDUCAÇÃO CRISTÃ
PROÉMIO


Importância e actualidade


O sagrado Concílio Ecuménico considerou atentamente a gravíssima importância da educação na vida do homem e a sua influência cada vez maior no progresso social do nosso tempo(1). Na verdade, a educação dos jovens, e até uma certa formação continuada dos adultos torna-se, nas circunstâncias actuais, não só mais fácil mas também mais urgente. Com efeito, os homens, mais plenamente conscientes da própria dignidade e do próprio dever, anseiam por tomar parte cada vez mais activamente na vida social , sobretudo, na vida económica e política (2); os admiráveis progressos da técnica e da investigação científica e os novos meios de comunicação social dão aos homens a oportunidade de, gozando por vezes de mais tempo livre, conseguirem mais facilmente a cultura intelectual e moral e de mútuamente se aperfeiçoarem, mercê dos laços de união mais estreitos quer com os grupos quer mesmo com os povos.
Por isso, em toda a parte se fazem esforços para promover cada vez mais a educação; declaram-se e registam-se em documentos públicos os direitos fundamentais dos homens e, em particular, dos filhos e dos pais, relativos à educação (3); com o aumento crescente do número de alunos, multiplicam-se e aperfeiçoam-se as escolas e fundam-se outros centros de educação; cultivam-se, com novas experiências, os métodos de educação e de instrução; realizam-se grandes esforços para que tais métodos estejam à disposição de todos os homens, embora muitas crianças e jovens ainda não possuam a formação mais elementar, e tantos outros careçam de educação adequada, na qual se cultivem simultâneamente a verdade e a caridade.
Visto que a santa Mãe Igreja, para realizar o mandato recebido do seu fundador, de anunciar o mistério da salvação a todos os homens e de tudo restaurar em Cristo, deve cuidar de toda a vida do homem, mesmo da terrena enquanto está relacionada com a vocação celeste (4), tem a sua parte no progresso e ampliação da educação. Por isso, o sagrado Concílio enuncia alguns princípios fundamentais sobre a educação cristã mormente nas escolas, princípios que serão depois desenvolvidos por uma Comissão especial e aplicada nos diversos lugares pelas Conferências episcopais.


Direito universal à educação


1. Todos os homens, de qualquer estirpe, condição e idade, visto gozarem da dignidade de pessoa, têm direito inalienável a uma educação (5) correspondente ao próprio fim (6), acomodada à própria índole, sexo, cultura e tradições pátrias, e, ao mesmo tempo, aberta ao consórcio fraterno com os outros povos para favorecer a verdadeira unidade e paz na terra. A verdadeira educação, porém, pretende a formação da pessoa humana em ordem ao seu fim último e, ao mesmo tempo, ao bem das sociedades de que o homem é membro e em cujas responsabilidades, uma vez adulto, tomará parte.
Por isso, é necessário que, tendo em conta os progressos da psicologia, pedagogia e didáctica, as crianças e os adolescentes sejam ajudados em ordem ao desenvolvimento harmónico das qualidades físicas, morais e intelectuais, e à aquisição gradual dum sentido mais perfeito da responsabilidade na própria vida, rectamente cultivada com esforço contínuo e levada por diante na verdadeira liberdade, vencendo os obstáculos com magnanimidade e constância. Sejam formados numa educação sexual positiva e prudente, à medida que vão crescendo. Além disso, de tal modo se preparem para tomar parte na vida social, que, devidamente munidos dos instrumentos necessários e oportunos, sejam capazes de inserir-se activamente nos vários agrupamentos da comunidade humana, se abram ao diálogo com os outros e se esforcem de boa vontade por cooperar no bem comum.
De igual modo, o sagrado Concílio declara que as, crianças e os adolescentes têm direito de serem estimulados a estimar rectamente os valores morais e a abraçá-los pessoalmente, bem como a conhecer e a amar Deus mais perfeitamente. Por isso, pede insistentemente a todos os que governam os povos ou orientam a educação, para que providenciem que a juventude nunca seja privada deste sagrado direito. Exorta, porém, os filhos da Igreja a que colaborem generosamente em todo o campo da educação, sobretudo com a intenção de que se possam estender o mais depressa possível a todos e em toda a parte os justos benefícios da educação e da instrução(7).


Natureza e fim da educação cristã


2. Todos os cristãos que, uma vez feitos nova criatura mediante a regeneração pela água e pelo Espírito Santo(8), se chamam e são de facto filhos de Deus, têm direito à educação cristã. Esta procura dar não só a maturidade da pessoa humana acima descrita, mas tende principalmente a fazer com que os baptizados, enquanto são introduzidos gradualmente no conhecimento do mistério da salvação, se tornem cada vez mais conscientes do dom da fé que receberam; aprendam, principalmente na acção litúrgica, a adorar Deus Pai em espírito e verdade (cfr. Jo. 4,23), disponham-se a levar a própria vida segundo o homem novo em justiça e santidade de verdade (EL 4, 22-24); e assim se aproximem do homem perfeito, da idade plena de Cristo (cfr. Ef. 4,13) e colaborem no aumento do Corpo místico. Além disso, conscientes da sua vocação; habituem-se quer a testemunhar a esperança que neles existe (cf. 1 Ped. 3,15), quer a ajudar a conformação cristã do mundo, mediante a qual os valores naturais assumidos na consideração integral do homem redimido por Cristo, cooperem no bem de toda a sociedade (9). Por isso, este sagrado Concílio lembra aos pastores de almas o dever de dispor as coisas de maneira que todos os fiéis gozem desta educação cristã, sobretudo os jovens que são a esperança da Igreja (10).


Os educadores: pais, sociedade civil e Igreja


3. Os pais, que transmitiram a vida aos filhos, têm uma gravíssima obrigação de educar a prole e, por isso, devem ser reconhecidos como seus primeiros e principais educadores (11). Esta função educativa é de tanto peso que, onde não existir, dificilmente poderá ser suprida. Com efeito, é dever dos pais criar um ambiente de tal modo animado pelo amor e pela piedade para com Deus e para com os homens que favoreça a completa educação pessoal e social dos filhos. A família é, portanto, a primeira escola das virtudes sociais de que as sociedades têm necessidade. Mas, é sobretudo, na família cristã, ornada da graça e do dever do sacramento do Matrimónio, que devem ser ensinados os filhos desde os primeiros anos, segundo a fé recebida no Baptismo a conhecer e a adorar Deus e a amar o próximo; é aí que eles encontram a primeira experiência quer da sã sociedade humana quer da Igreja; é pela família, enfim, que eles são pouco a pouco introduzidos no consórcio civil dos homens e no Povo de Deus. Caiam, portanto, os pais na conta da importância da família verdadeiramente cristã na vida e progresso do próprio Povo de Deus(12).
O dever de educar, que pertence primariamente à família, precisa da ajuda de toda a sociedade. Portanto, além dos direitos dos pais e de outros a quem os pais confiam uma parte do trabalho de educação, há certos deveres e direitos que competem à sociedade civil, enquanto pertence a esta ordenar o que se requer para o bem comum temporal. Faz parte dos seus deveres promover de vários modos a educação da juventude: defender os deveres e direitos dos pais e de outros que colaboram na educação e auxiliá-los; segundo o princípio da subsidiariedade, ultimar a obra da educação, se falharem os esforços dos pais e das outras sociedades, tendo, todavia, em consideração, os desejos dos pais; além disso, fundar escolas e instituições próprias, na medida em que o bem comum o exigir (13).
Finalmente, por uma razão particular pertence à Igreja o dever de educar, leão só porque deve também ser reconhecida como sociedade humana capaz de ministrar a educação, mas sobretudo porque tem o dever de anunciar a todos os homens o caminho da salvação, de comunicar aos crentes a vida de Cristo e ajudá-los, com a sua contínua solicitude, a conseguir a plenitude desta vida (14). Portanto, a Igreja é obrigada a dar, como mãe, a estes seus filhos aquela educação, mercê da qual toda a sua vida seja imbuída do espírito de Cristo; ao mesmo tempo, porém, colabora com todos os povos na promoção da perfeição integral da pessoa humana, no bem da sociedade terrestre e na edificação dum mundo configurado mais humanamente (15).


Meios da Igreja para a educação cristã


4. No desempenho do seu múnus educativo, a Igreja preocupa-se com todos os meios aptos, sobretudo com aqueles que lhe pertencem; o primeiro dos quais é a instrução catequética (16) que ilumina e fortalece a fé, alimenta a vida segundo o espírito de Cristo, leva a uma participação consciente e activa no mistério de Cristo (17) e impele à acção apostólica. A Igreja aprecia muito e procura penetrar e elevar com o seu espírito também os restantes meios, para cultivar as almas e formar os homens, como são os meios de comunicação social (18), as múltiplas organizações culturais e desportivas, os agrupamentos juvenis e, sobretudo, as escolas.


Importância das escolas


5. Entre todos os meios de educação, tem especial importância a escola (19), que, em virtude da sua missão, enquanto cultiva atentamente as faculdades intelectuais, desenvolve a capacidade de julgar rectamente, introduz no património cultural adquirido pelas gerações passadas, promove o sentido dos valores, prepara a vida profissional, e criando entre alunos de índole e condição diferentes um convívio amigável, favorece a disposição à compreensão mútua; além disso, constitui como que um centro em cuja operosidade e progresso devem tomar parte, juntamente, as famílias, os professores, os vários agrupamentos que promovem a vida cultural, cívica e religiosa, a sociedade civil e toda a comunidade humana.
É bela, portanto, e de grande responsabilidade a vocação de todos aqueles que, ajudando os pais no cumprimento do seu dever e fazendo as vezes da comunidade humana, têm o dever de educar nas escolas; esta vocação exige especiais qualidades de inteligência e de coração, uma preparação esmeradíssima e uma vontade sempre pronta à renovação e adaptação.


Obrigações e direitos dos pais


6. Os pais, cujo primeiro e inalienável dever e direito é educar os filhos, devem gozar de verdadeira liberdade na escolha da escola. Por isso, o poder público, a quem pertence proteger e defender as liberdades dos cidadãos, deve cuidar, segundo a justiça distributiva, que sejam concedidos subsídios públicos de tal modo que os pais possam escolher, segundo a própria consciência, com toda a liberdade, as escolas para os seus filhos (20).
De resto, é próprio do poder público providenciar para que todos os cidadãos possam alcançar uma justa participação na cultura e sejam preparados para exercer devidamente os deveres e os direitos civis Portanto, o mesmo poder público deve defender o direito das crianças a uma adequada educação escolar, velar pela competência dos professores e pela eficácia dos estudos, atender à saúde dos alunos e, em geral, promover todo o trabalho escolar, tendo em consideração o dever da subsidiariedade e, portanto, excluindo o monopólio do ensino, que vai contra os direitos inatos da pessoa humana, contra o progresso e divulgação da própria cultura, contra o convívio pacífico dos cidadãos e contra o pluralismo que vigora em muitíssimas sociedades de hoje (21).
O sagrado Concílio, porém, exorta os fiéis a colaborarem espontâneamente quer para encontrar os métodos aptos de educação e de organização dos estudos, quer para formar professores capazes de educar rectamente os jovens; secundem com o seu auxílio, sobretudo mediante associações dos pais, todo o trabalho da escola e em particular a educação moral que na escola deve ser ministrada (22).


Solicitude pelos alunos das escolas não-católicas


7. Tendo, além disso, a consciência do dever gravíssimo de cuidar zelosamente da educação moral e religiosa de todos os seus filhos, a Igreja sabe que deve estar presente com o seu particular afecto e com o seu auxílio aos que são formados em escolas não católicas: quer pelo testemunho de vida dos professores e directores, quer pela acção apostólica dos colegas (23), quer sobretudo pelo ministério dos sacerdotes e dos leigos que lhes ensinam a doutrina da salvação, adaptada à idade e condição, e os auxiliam espiritualmente com iniciativas oportunas segundo as circunstâncias.
Lembra, porém, aos pais o grave dever que lhes incumbe de tudo disporem, ou até exigirem, para que os seus filhos possam gozar de tais auxílios e progredir harmónicamente na formação cristã e profana. Por isso, a Igreja louva aquelas autoridades e sociedades civis que, tendo em conta o pluralismo da sociedade hodierna e atendendo à justa liberdade religiosa, ajudam as famílias para que a educação dos filhos possa ser dada em todas as escolas segundo os princípios morais e religiosos das mesmas famílias (24).


Escolas católicas: importância.

Direito da igreja


8. A presença da Igreja no campo escolar manifesta-se de modo particular por meio da escola católica. É verdade que esta busca, não menos que as demais escolas, fins culturais e a formação humana da juventude. É próprio dela, todavia, criar um ambiente de comunidade escolar animado pelo espírito evangélico de liberdade e de caridade, ajudar os adolescentes para que, ao mesmo tempo que desenvolvem a sua personalidade, cresçam segundo a nova criatura que são mercê do Baptismo, e ordenar finalmente toda a cultura humana à mensagem da salvação, de tal modo que seja iluminado pela fé o conhecimento que -os alunos adquirem gradualmente a respeito do mundo, da vida e do homem (25). Assim, a escola católica, enquanto se abre convenientemente às condições do progresso do nosso tempo, educa os alunos na promoção eficaz do bem da cidade terrestre, e prepara-os para o serviço da dilatação do reino de Deus, para que, pelo exercício duma vida exemplar e apostólica, se tornem como que o fermento salutar da comunidade humana.
Por isso, visto que a escola católica tanto pode ajudar na realização da missão do Povo de Deus, e tanto pode servir o diálogo entre a Igreja e a comunidade humana, para benefício dos homens, também nas circunstâncias actuais conserva a sua gravíssima importância. Por tal motivo, este sagrado Concílio proclama mais uma vez que a Igreja tem o direito, já declarado em muitíssimos documentos do magistério (26), de livremente fundar e dirigir escolas de qualquer espécie e grau, recordando que o exercício de tal direito muito pode concorrer para a liberdade de consciência e defesa dos direitos dos pais, bem como para o progresso da própria cultura.
Lembrem-se, porém, os professores de que sobretudo deles depende que a escola católica possa realizar os seus intentos e iniciativas (27). Sejam, por isso, preparados com particular solicitude, para que estejam munidos de ciência quer profana quer religiosa, comprovada pelos respectivos títulos, e possuam a arte de educar, de harmonia com o progresso dos nossos dias. Unidos entre si e com os alunos pela caridade, e imbuídos de espírito apostólico, dêem testemunho de Cristo, mestre único, quer com a vida quer com a doutrina. Colaborem, sobretudo, com os pais; juntamente com eles, tenham na devida consideração, em toda a obra educativa, a diferença sexual e o fim próprio atribuído pela Providência divina a cada sexo na família e na sociedade; esforcem-se por suscitar a acção pessoal dos alunos, e, depois de acabado o curso escolar, continuem a acompanhá-los com o conselho, a amizade e com a organização de associações peculiares imbuídas de verdadeiro espírito eclesial. .O sagrado Concílio declara que o ministério destes professores é um autêntico apostolado, muito oportuno e necessário também nos nossos dias, e, ao mesmo tempo, um verdadeiro serviço prestado à sociedade. E aos pais católicos recorda o dever de confiarem os seus filhos, quando e onde puderem às escolas católicas, de as sustentarem segundo as suas forças e de colaborarem com elas para bem dos próprios filhos (28).


Diversas espécies de escolas católicas


9. É necessário que todas as escolas, de qualquer modo dependentes da Igreja, sejam conformes a este modelo de escola católica, embora esta possa revestir várias formas segundo as condições de lugar (29). Sem dúvida a Igreja estima profundamente também as escolas católicas que, sobretudo nos territórios das novas cristandades, são frequentadas por alunos não católicos.
De resto, devem ter-se em conta as necessidades do nosso tempo na fundação e organização das escolas católicas. Por isso, se por um lado devem continuar a ser promovidas as escolas inferiores e médias que constituem o alicerce da educação, também devem ser tidas em muita conta aquelas que as condições hodiernas exigem dum modo particular, como são as chamadas escolas profissionais (30) e técnicas, as instituições destinadas à educação dos adultos, à promoção dos socorros sociais bem como àqueles que, por defeito da natureza, necessitam de cuidado particular, e as escolas em que os professores são preparados em função quer da formação religiosa quer das demais formas de educação.
O sagrado Concílio exorta veementemente tanto os pastores da Igreja como os fiéis a que, não omitindo nenhum sacrifício, ajudem as escolas católicas na realização cada vez mais perfeita do seu múnus, e, antes de mais, remediando as necessidades daqueles que são pobres de bens temporais ou privados do auxílio e do afecto da família ou desprovidos do dom da fé.


Faculdades e Universidades católicas


10. A Igreja acompanha igualmente com zelosa solicitude as escolas de nível superior, sobretudo as Universidades e as Faculdades. Mais ainda naquelas que dela dependem, procura de modo orgânico que cada disciplina seja de tal modo cultivada com princípios próprios, método próprio e liberdade própria da investigação científica, que se consiga uma inteligência cada vez mais profunda dela, e, consideradas cuidadosamente as questões e as investigações actuais, se veja mais profundamente como a fé e a razão conspiram para a verdade única, segundo as pisadas dos doutores da Igreja, mormente de S. Tomás de Aquino (31). E assim se consiga a presença pública, estável e universal da mentalidade cristã em todo o esforço de promoção da cultura superior, e que os alunos destas instituições se façam homens verdadeiramente notáveis pela doutrina, preparados para aceitar os mais importantes cargos na sociedade e ser testemunhas da fé no mundo (32).
Nas Universidades católicas onde não existe nenhuma Faculdade de sagrada teologia, funde-se um Instituto ou uma cátedra de sagrada teologia, na qual se dêem lições adaptadas também a alunos leigos. Visto que as ciências progridem sobretudo mercê de investigações especiais de maior alcance científico, favoreçam-se o mais possível nas Universidades e Faculdades católicas aqueles institutos cujo fim primário é a promoção da investigação científica.
O sagrado Concílio muito recomenda que se fundem Universidades e Faculdades católicas, convenientemente distribuídas pelas diversas partes da terra, de tal maneira, porém, que brilhem não pelo número mas pela dedicação à ciência; e facilite-se a entrada aos alunos de maior esperança, embora de pouca fortuna, sobretudo aos oriundos das nações jovens.
Já que a sorte da sociedade e da própria Igreja está intimamente relacionada com o bom aproveitamento dos jovens dados aos estudos superiores (33), os pastores da Igreja não só tenham grande cuidado pela vida espiritual dos alunos que frequentam as Universidades católicas, mas, solícitos da formação espiritual de todos os seus filhos, nas reuniões episcopais oportunamente convocadas, providenciem para que também junto das Universidades não católicas haja residências e centros universitários católicos, nos quais sacerdotes, religiosos e leigos, cuidadosamente escolhidos e preparados, dêem um auxílio espiritual e intelectual permanente à juventude universitária. Porém, os jovens de melhor talento quer das Universidades católicas quer das outras, que pareçam aptos para o ensino e para a investigação, sejam cultivados com especial cuidado e preparados para o exercício do magistério.


Faculdades de ciências sagradas


11. A Igreja espera muitíssimo do trabalho das Faculdades de ciências sagradas (34). Com efeito, a elas confia o gravíssimo dever de preparar os próprios alunos não só para o ministério sacerdotal mas, sobretudo, quer para ensinarem nas cátedras dos estudos eclesiásticos superiores, quer para fazerem progredir as disciplinas com o próprio esforço, quer para receberem os encargos mais pesados do apostolado intelectual. Da mesma maneira, é dever dessas Faculdades investigar mais profundamente os vários campos das disciplinas sagradas, de tal maneira que se consiga uma inteligência cada vez mais profunda da Sagrada Escritura, se patenteie mais plenamente o património da sabedoria cristã transmitido pelos antepassados, se promova o diálogo com os irmãos separados e com os não cristãos e se dê resposta às questões nascidas do progresso da ciência (35).
Por isso, as Faculdades eclesiásticas, depois de oportunamente revistas as suas leis, promovam zelosamente as ciências sagradas e as outras com elas relacionadas e, usando os métodos e instrumentos mais modernos, formem os alunos para mais altas investigações.


A coordenação das escolas católicas


12. Como a colaboração, que em nível diocesano, nacional e internacional se torna cada vez mais urgente e adquire mais força, é igualmente muito necessária no campo escolar, deve procurar-se com todas as forças que entre as escolas católicas se favoreça uma apta coordenação, e, entre elas e as restantes escolas se intensifique a cooperação exigida pelo bem de toda a comunidade humana (36).
Da maior coordenação e colaboração, sobretudo no âmbito dos Institutos académicos, se colherão frutos mais abundantes. Por isso, em todas as Universidades colaborem as várias Faculdades entre si, tanto quanto o seu objecto o permitir. Também as próprias Universidades cooperem entre si com esforços unidos, organizando conjuntamente congressos internacionais, distribuindo entre si o trabalho de investigação científica, comunicando umas às outras as próprias descobertas, permutando temporáriamente os professores, e promovendo tudo quanto favoreça uma maior ajuda mútua.


CONCLUSÃO


Conclusão: exortação aos educadores e alunos


O sagrado Concílio exorta vivamente os jovens a que, conscientes ,s da importância do múnus educativo, estejam preparados para o receberem os com ânimo generoso, sobretudo naquelas regiões em que, por falta de professores, a educação da juventude está em perigo. O mesmo sagrado Concílio, enquanto se confessa muito grato aos sacerdotes, religiosos, religiosas e leigos que se ocupam com dedicação evangélica na obra excelente da educação e do ensino de qualquer espécie e grau, exorta-os a que perseverem generosamente no trabalho começado e a que de tal modo se esforcem por sobressair em encher os alunos do espírito de Cristo, na arte pedagógica e no estudo das ciências que não só promovam a renovação interna da Igreja mas também conservem e aumentem a sua presença benéfica no mundo hodierno, sobretudo no intelectual.


                                                Roma, 28 de Outubro de 1965.
                                                      PAPA PAULO VI
Texto retirado do Site:

Apostolicam Actuositatem- Atividade Apostólica


DECRETOAPOSTOLICAM ACTUOSITATEM
SOBRE O APOSTOLADO DOS LEIGOS
PROÉMIO


Importância e actualidade do apostolado dos leigos na vida da Igreja


1. O sagrado Concílio, desejando tornar mais intensa a actividade apostólica do Povo de Deus(1), volta-se com muito empenho para os cristãos leigos, cujas funções próprias e indispensáveis na missão da Igreja já em outros lugares recordou (2). Com efeito, o apostolado dos leigos, que deriva da própria vocação cristã, jamais poderá faltar na Igreja. A mesma Sagrada Escritura demonstra abundantemente como foi espontânea e frutuosa esta actividade no começo da Igreja (cfr. Act. 11, 19-21: 18, 26; Rom. 16, 1-16; Fil. 4, 3).
Os nossos tempos, porém, não exigem um menor zelo dos leigos; mais ainda, as condições actuais exigem deles absolutamente um apostolado cada vez mais intenso e mais universal. Com efeito, o aumento crescente da população, o progresso da ciência e da técnica, as relações mais estreitas entre os homens, não só dilataram imenso os campos do apostolado dos leigos, em grande parte acessíveis só a eles, mas também suscitaram novos problemas que reclamam a sua atenção interessada e o seu esforço. Este apostolado torna-se tanto mais urgente quanto a autonomia de muitos sectores da vida humana, como é justo, aumentou, por vezes com um certo afastamento da ordem ética e religiosa e com grave perigo para a vida cristã. Além disso, em muitas regiões onde os sacerdotes são demasiado poucos ou, como acontece por vezes, são privados da liberdade de ministério, a Igreja dificilmente poderia estar presente e activa sem o trabalho dós leigos.
Sinal desta multíplice e urgente necessidade é a evidente actuação do Espírito Santo que hoje torna os leigos cada vez mais conscientes da própria responsabilidade e por toda a parte os anima ao serviço de Cristo e da Igreja (3).
No presente Decreto, o Concílio entende ilustrar a natureza, a índole e a variedade do apostolado dos leigos, bem como enunciar os princípios fundamentais e dar as orientações pastorais para o seu mais eficaz exercício; tudo isto deverá servir de norma na revisão do Direito canónico na parte que diz respeito ao apostolado dos leigos.

CAPÍTULO I

A VOCAÇÃO DOS LEIGOS AO APOSTOLADO

Participação dos leigos na missão da Igreja
2. A Igreja nasceu para tornar todos os homens participantes da redenção salvadora (1) e, por eles, ordenar efectivamente a Cristo o universo inteiro, dilatando pelo mundo o seu reino para glória de Deus Pai. Toda a actividade do Corpo místico que a este fim se oriente, chama-se apostolado. A Igreja exerce-o de diversas maneiras, por meio de todos os seus membros, já que a vocação cristã é também, por sua própria natureza, vocação ao apostolado. Do mesmo modo que num corpo vivo nenhum membro tem um papel meramente passivo, mas antes, juntamente com a vida do corpo, também participa na sua actividade, assim também no Corpo de Cristo, que é a Igreja, todo o corpo «cresce segundo a operação própria de cada um dos seus membros» (Ef. 4, 16). Mais ainda: é tanta neste corpo a conexão e coesão dos membros (cfr. Ef. 4, 16), que se deve dizer que não aproveita nem à Igreja nem a si mesmo aquele membro que não trabalhar para o crescimento do corpo, segundo a própria capacidade.
Existe na Igreja diversidade de funções, mas unidade de missão. Aos Apóstolos e seus sucessores, confiou Cristo a missão de ensinar, santificar e governar em seu nome e com o seu poder. Mas os leigos, dado que são participantes do múnus sacerdotal, profético e real de Cristo, têm um papel próprio a desempenhar na missão do inteiro Povo de Deus, na Igreja e no mundo (2). Exercem, com efeito, apostolado com a sua acção para evangelizar e santificar os homens e para impregnar e aperfeiçoar a ordem temporal com o espírito do Evangelho; deste modo, a sua actividade nesta ordem dá claro testemunho de Cristo e contribui para a salvação dos homens. E sendo próprio do estado dos leigos viver no meio do mundo e das ocupações seculares, eles são chamados por Deus para, cheios de fervor cristão, exercerem como fermento o seu apostolado no meio do mundo.


Fundamentos do apostolado dos leigos


3. O dever e o direito ao apostolado advêm aos leigos da sua mesma união com Cristo cabeça. Com efeito, inseridos pelo Baptismo no Corpo místico de Cristo, e robustecidos pela Confirmação com a força do Espírito Santo, é pelo Senhor mesmo que são destinados ao apostolado. São consagrados em ordem a um sacerdócio real e um povo santo (cfr. 1 Ped. 2, 4-10) para que todas as suas actividades sejam oblações espirituais e por toda a terra dêem testemunho de Cristo. E os sacramentos, sobretudo a sagrada Eucaristia, comunicam e alimentam neles aquele amor que é a alma de todo o apostolado (3).
O apostolado exercita-se na fé, na esperança e na caridade, virtudes que o Espírito Santo derrama no coração de todos os membros da Igreja. Mais o preceito do amor, que é o maior mandamento do Senhor, estimula todos os fiéis a que procurem a glória de Deus, pelo advento do Seu reino, e a vida eterna para todos os homens, de modo que eles conheçam o único Deus verdadeiro e Jesus Cristo, seu enviado (cfr. Jo. 17, 3).
A todos os fiéis incumbe, portanto, o glorioso encargo de trabalhar para que a mensagem divina da salvação seja conhecida e recebida por todos os homens em toda a terra.
O Espírito Santo - que opera a santificação do Povo de Deus por meio do ministério e dos sacramentos - concede também aos fiéis, para exercerem este apostolado, dons particulares (cfr. 1 Cor. 12, 7), «distribuindo-os por cada um conforme lhe apraz» (1 Cor. 12, 11), a fim de que «cada um ponha ao serviço dos outros a graça que recebeu» e todos actuem, «como bons administradores da multiforme graça de Deus» (1 Ped. 4, 10), para a edificação, no amor, do corpo todo (cfr. Ef. 4, 1). A recepção destes carismas, mesmo dos mais simples, confere a cada um dos fiéis o direito e o dever de os actuar na Igreja e no mundo, para bem dos homens e edificação da Igreja, na liberdade do Espírito Santo, que :(sopra onde quer» (Jo. 3, 8) e, simultâneamente, em comunhão com os outros irmãos em Cristo, sobretudo com os próprios pastores; a estes compete julgar da sua autenticidade e exercício ordenado, não de modo a apagarem o Espírito, mas para que tudo apreciem e retenham o que é bom (cfr. 1 Tess. 5, 12.19.21)(4).


A espiritualidade dos leigos em ordem ao apostolado


4. A fonte e origem de todo o apostolado da Igreja é Cristo, enviado pelo Pai. Sendo assim, é evidente que a fecundidade do apostolado dos leigos depende da sua união vital com Cristo, segundo as palavras do Senhor: ,aquele que permanece em mim e em quem eu permaneço, esse produz muito fruto; pois, sem mim, nada podeis fazer» (Jo. 15, 5). Esta vida de íntima união com Cristo na Igreja é alimentada pelos auxílios espirituais comuns a todos os fiéis e, de modo especial, pela participação activa na sagrada Liturgia(5); e os leigos devem servir-se deles de tal modo que, desempenhando correctamente as diversas tarefas terrenas nas condições ordinárias da existência, não separem da própria vida a união com Cristo, mas antes, realizando a própria actividade segundo a vontade de Deus, nela cresçam. É por este caminho que os leigos devem avançar na santidade com entusiasmo e alegria, esforçando-se por superar as dificuldades com prudência e paciência (6). Nem os cuidados familiares nem outras ocupações profanas devem ser alheias à vida espiritual, conforme aquele ensinamento do Apóstolo: tudo o que fizerdes, por palavras ou por obras, tudo seja em nome do Senhor Jesus Cristo, dando por Ele graças a Deus Pai» (Col. 3, 17).
Esta vida exige o exercício constante da fé, da esperança e da caridade.
Só com a luz da fé e a meditação da palavra de Deus pode alguém reconhecer sempre e em toda a parte a Deus no qual «vivemos, nos inovemos e existimos» (Act. 17, 28), procurar em todas as circunstâncias a Sua vontade, ver Cristo em todos os homens, quer chegados quer estranhos, julgar rectamente do verdadeiro sentido e valor das realidades temporais, em si mesmas e em ordem ao fim do homem.
Aqueles que possuem tal fé, vivem na esperança da manifestação dos filhos de Deus, lembrados da cruz e da ressurreição do Senhor. Na peregrinação que é a presente vida, escondidos com Cristo em Deus e libertados da escravidão das riquezas, ao mesmo tempo que tendem para aqueles bens que permanecem eternamente, dedicam-se generosa e inteiramente a dilatar o reino de Deus e a informar e actuar com o espírito cristão a ordem temporal. No meio das adversidades desta vida, encontram força na esperança, sabendo que «os sofrimentos presentes não têm comparação com a glória futura que em nós se manifestará» (Rom. 8, 18).
Impelidos pela caridade que vem de Deus, praticam o bem com relação a todos, sobretudo para com os irmãos na fé (cfr. Gál. 6, 10), despojando-se «de toda a malícia e engano, hipocrisias, invejas e toda a espécie de maledicências» (1 Ped. 2, 1) e assim atraem a Cristo todos os homens. O amor de Deus que «foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo, que nos foi dado» (Rom. 5, 5), toma os leigos capazes de exprimir em verdade, na própria vida, o espírito das Bem-aventuranças. Seguindo a Cristo pobre, nem se deixam abater com a falta dos bens temporais nem se exaltam com a sua abundância; imitando a Cristo humilde, não são cobiçosos da glória vã (cfr. Gál. 5, 26), mas procuram mais agradar a Deus que aos homens, sempre dispostos a deixar tudo por Cristo (cfr. Lc. 14, 26) e a sofrer perseguição pela justiça (cfr. Mt. 5, 10), lembrados da palavra do Senhor: «se alguém quiser seguir-me, abnegue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me» (Mt. 16, 24). Finalmente, fomentando entre si a amizade cristã, prestam-se mútuamente ajuda em todas as necessidades.
Esta espiritualidade dos leigos deverá assumir características especiais, conforme o estado de matrimónio e familiar, de celibato ou viuvez, situação de enfermidade, actividade profissional e social. Não deixem, por isso, de cultivar assiduamente as qualidades e dotes condizentes a essas situações, e utilizar os dons por cada um recebidos do Espírito Santo.
Além disso, aqueles leigos que, seguindo a própria vocação, se alistaram em alguma das associações ou institutos aprovados pela Igreja, devem de igual modo esforçar-se por assimilar as características da espiritualidade que lhes é própria.
Tenham também em muito apreço a competência profissional, o sentido de família e o sentido cívico e as virtudes próprias da convivência social, como a honradez, o espírito de justiça, a sinceridade, a amabilidade, a fortaleza de ânimo, sem as quais também se não pode dar uma vida cristã autêntica.
O modelo perfeito desta vida espiritual e apostólica é a bem-aventurada Virgem Maria, rainha dos Apóstolos: levando, na terra, uma vida semelhante à a todo o momento se mantinha unida a seu Filho e de modo singular cooperou na obra do Salvador; agora, elevada ao céu, «cuida com amor materno dos irmãos de seu Filho que, entre perigos e angústias, peregrinam ainda na terra, até chegarem à pátria bem-aventurada» (7). Prestem-lhe todos um culto cheio de devoção e confiem à sua solicitude materna a própria vida e apostolado.


CAPÍTULO II


OS FINS DO APOSTOLADO DOS LEIGOS


Introdução: a obra de Cristo e da Igreja
5. A obra redentora de Cristo, que por natureza visa salvar os homens, compreende também a restauração de toda a ordem temporal. Daí que a missão da Igreja consiste não só em levar aos homens a mensagem e a graça de Cristo, mas também em penetrar e actuar com o espírito do Evangelho as realidades temporais. Por este motivo, os leigos, realizando esta missão da Igreja, exercem o seu apostolado tanto na Igreja como no mundo, tanto na ordem espiritual como na temporal. Estas ordens, embora distintas, estão de tal modo unidas no único desígnio divino que o próprio Deus pretende reintegrar, em Cristo, o universo inteiro, numa nova criatura, dum modo incoativo na terra, plenamente no último dia. O leigo, que é simultâneamente fiel e cidadão, deve sempre guiar-se, em ambas as ordens, por uma única consciência, a cristã.


O apostolado para a evangelização e santificação do mundo


6. A missão da Igreja tem como fim a salvação dos homens, a alcançar pela fé em Cristo e pela sua graça. Por este motivo, o apostolado da Igreja e de todos os seus membros ordena-se, antes de mais, a manifestar ao mundo, por palavras e obras, a mensagem de Cristo, e a comunicar a sua graça. Isto realiza-se sobretudo por meio do ministério da palavra e dos sacramentos, especialmente confiado ao clero, no qual também os leigos têm grande papel a desempenhar, para se tornarem «cooperadores da verdade» (3 Jo. 8). É sobretudo nesta ordem que o apostolado dos leigos e o ministério pastoral se completam mùtuamente.
Inúmeras oportunidades se oferecem aos leigos para exercerem o apostolado de evangelização e santificação. O próprio testemunho da vida cristã e as obras, feitas com espírito sobrenatural, têm eficácia para atrair os homens à fé e a Deus; diz o Senhor: «Assim brilhe a vossa luz diante dos homens, de modo que vejam as vossas boas obras e dêem glória ao vosso Pai que está nos céus» (Mt. 5, 16).
Este apostolado, contudo, não consiste apenas no testemunho da vida; o verdadeiro apóstolo busca ocasiões de anunciar Cristo por palavra, quer aos não crentes para os levar à fé, quer aos fiéis, para os instruir, confirmar e animar a uma vida fervorosa; «com efeito, o amor de Cristo estimula-nos» (2 Cor. 5, 14); e devem encontrar eco no coração de todos aquelas palavras do Apóstolo: «ai de mim, se não prego o Evangelho» (1 Cor. 9,16) (1).
E dado que no nosso tempo surgem novos problemas e se difundem gravíssimos erros que ameaçam subverter a religião, a ordem moral e a própria sociedade humana, este sagrado Concílio exorta ardentemente os leigos a que, na medida da própria capacidade e conhecimentos, desempenhem com mais diligência a parte que lhes cabe na elucidação, defesa e recta aplicação dos princípios cristãos aos problemas d6 nosso tempo, segundo a mente da Igreja.


Instauração cristã da ordem temporal


7. A vontade de Deus com respeito ao mundo é que os homens, em boa harmonia, edifiquem a ordem temporal e a aperfeiçoem constantemente.
Todas as realidades que constituem a ordem temporal-os bens da vida e da família, a cultura, os bens económicos, as artes e profissões, as instituições políticas, as relações internacionais e outras semelhantes, bem como a sua evolução e progresso -não só são meios para o fim último do homem, mas possuem valor próprio, que lhes vem de Deus, quer consideradas em si mesmas, quer como partes da ordem temporal total: «e viu Deus todas as coisas que fizera, e eram todas muito boas» (Gén. 1, 31). Esta bondade natural das coisas adquire uma dignidade especial pela sua relação com a pessoa humana, para cujo serviço foram criadas. Finalmente, aprouve a Deus reunir todas as coisas em Cristo, quer as naturais quer as sobrenaturais, «de modo que em todas Ele tenha o primado» (Col. 1, 18). Mas este destino, não só não priva a ordem temporal da sua autonomia, dos seus fins próprios, das suas leis, dos seus recursos, do seu valor para bem dos homens, mas antes a aperfeiçoa na sua consistência e dignidade próprias, ao mesmo tempo que a ajusta à vocação integral do homem na terra.
O uso das coisas temporais foi, no decurso da história, manchado com graves abusos. É que os homens, atingidos pelo pecado original, caíram muitas vezes em muitos erros acerca do verdadeiro Deus, .da natureza do homem e dos princípios da lei moral. Daí a corrupção dos costumes e das instituições humanas, daí a pessoa humana tantas vezes conculcada. Também em nossos dias, não poucos, confiando em excesso no progresso das ciências naturais e da técnica, caem numa espécie de idolatria das coisas materiais, das quais em vez de senhores se tornam escravos.
Toda a Igreja deve trabalhar por tornar os homens capazes de edificar rectamente a ordem temporal e de a ordenar, por Cristo, para Deus. Aos pastores compete propor claramente os princípios relativos ao fim da criação e ao uso do mundo e proporcionar os auxílios morais e espirituais para que a ordem temporal se edifique em Cristo.
Quanto aos leigos, devem eles assumir como encargo próprio seu essa edificação da ordem temporal e agir nela de modo directo e definido, guiados pela luz do Evangelho e a mente da Igreja e movidos pela caridade cristã; enquanto cidadãos, cooperar com os demais com a sua competência específica e a própria responsabilidade; buscando sempre e em todas as coisas a justiça do reino de Deus. A ordem temporal deve ser construída de tal modo que, respeitadas integralmente as suas leis próprias, se torne, para além disso, conforme aos princípios da vida cristã, de modo adaptado às diferentes condições de lugares, tempos e povos. Entre as actividades deste apostolado sobressai a acção social dos cristãos, a qual o sagrado Concílio deseja que hoje se estenda a todos os domínios temporais, sem exceptuar o da cultura (2).


A acção caritativa como distintivo do apostolado cristão


8. Toda a actividade apostólica deve fluir e receber força da caridade; algumas obras, porém, prestam-se, por sua própria natureza, a tornarem-se viva expressão dessa caridade. Cristo quis que elas fossem sinais da sua missão messiânica (cfr. Mt. 11, 4-5).
O maior mandamento da lei é amar a Deus de todo o coração, e ao próximo como a si mesmo (cfr. Mt. 22, 37-40). Cristo fez deste mandamento do amor para com o próximo o seu mandamento, e enriqueceu-o com novo significado, identificando-se aos irmãos como objecto da caridade, dizendo: «sempre que o fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes» (Mt. 25, 40). Com efeito, assumindo a natureza humana, Ele uniu a si como família, por uma certa solidariedade sobrenatural, todos os homens e fez da caridade o sinal dos seus discípulos, com estas palavras: «nisto conhecerão todos que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros» (Jo. 13, 35).
A santa Igreja, assim como nos seus primeiros tempos, juntando a «ágape» à Ceia eucarística, se mostrava toda unida à volta de Cristo pelo vínculo da caridade, assim em todos os tempos se pode reconhecer por este sinal do amor. E alegrando-se com as realizações alheias, ela reserva para si, como dever e direito próprios, que não pode alinear, as obras de caridade. Por isso, a misericórdia para com os pobres e enfermos e as chamadas obras de caridade e de mútuo auxílio para socorrer as múltiplas necessidades humanas são pela Igreja honradas de modo especial (3).
Estas actividades e obras tornaram-se muito mais urgentes e universais no nosso tempo, em que os meios de comunicação são mais rápidos, em que quase se venceu a distância entre os homens e os habitantes de toda a terra se tornaram membros em certo modo duma só família. A actividade caritativa, hoje, pode e deve atingir as necessidades de todos os homens. Onde quer que se encontrem homens a quem faltam sustento, vestuário, casa, remédios, trabalho, instrução, meios necessários para levar uma vida verdadeiramente humana, afligidos pelas desgraças ou pela doença, sofrendo o exílio ou a prisão, aí os deve ir buscar e encontrar a caridade cristã, consolar com muita solicitude e ajudar com os auxílios prestados. Esta obrigação incumbe antes de mais aos homens e povos que disfrutam de condição próspera (4).
Para que este exercício da caridade seja e apareça acima de toda a suspeita, considere-se no próximo a imagem de Deus, para o qual foi criado, veja-se nele a Cristo, a quem realmente se oferece tudo o que ao indigente se dá; atenda-se com grande delicadeza à liberdade e dignidade da pessoa que recebe o auxílio; não se deixe manchar a pureza de intenção com qualquer busca do próprio interesse ou desejo de domínios (5); satisfaçam-se antes de mais as exigências da justiça, nem se ofereça como dom da caridade aquilo que já é devido a título de justiça; suprimam-se as causas dos males, e não apenas os seus efeitos; e de tal modo se preste a ajuda que os que a recebem se libertem a pouco e pouco da dependência alheia e se bastem a si mesmos.
Tenham, por isso, os leigos em grande apreço e ajudem quanto possam as obras caritativas e as iniciativas de assistência social, quer privadas quer públicas, e também internacionais, que levam auxílio eficaz aos indivíduos e aos povos necessitados, cooperando neste ponto com todos os homens de boa vontade (6).


CAPÍTULO III


OS VÁRIOS CAMPOS DO APOSTOLADO


Introdução: vários campos do apostolado dos leigos.
A Igreja


9. Os leigos exercem o seu apostolado multiforme tanto na Igreja como no mundo. Em ambos os planos se abrem vários campos de actividade apostólica de que queremos aqui lembrar os principais. São: as comunidades eclesiais, a família, a juventude, o meio social, as ordens nacional e internacional. E como hoje a mulher tem cada vez mais parte activa em toda a vida social, é da maior importância que ela tome uma participação mais ampla também nos vários campos do apostolado da Igreja.
10. Porque participam no múnus sacerdotal, profético e real de Cristo, têm os leigos parte activa na vida e acção da Igreja. A sua acção dentro das comunidades eclesiais é tão necessária que, sem ela, o próprio apostolado dos pastores não pode conseguir, a maior parte das vezes, todo o seu efeito. Porque os leigos com verdadeira mentalidade apostólica, à imagem daqueles homens e mulheres que ajudavam Paulo na propagação do Evangelho (cfr. Act. 18, 18, 20; Rom. 16, 3), suprem o que falta a seus irmãos e revigoram o espírito dos pastores e dos outros membros do povo fiel (cfr. 1 Cor. 16, 17-18). Pois eles, fortalecidos pela participação activa na vida litúrgica da comunidade, empenham-se nas obras apostólicas da mesma. Conduzem à Igreja os homens que porventura andem longe, cooperam intensamente na comunicação da palavra de Deus, sobretudo pela actividade catequética, e tornam mais eficaz, com o contributo da sua competência, a cura de almas e até a administração dos bens da Igreja.
A paróquia dá-nos um exemplo claro de apostolado comunitário porque congrega numa unidade toda a diversidade humana que aí se encontra e a insere na universalidade da Igreja (1). Acostumem-se os leigos a trabalhar na paróquia intimamente unidos aos seus sacerdotes (2), a trazer para a comunidade eclesial os próprios problemas e os do mundo e as questões que dizem respeito à salvação dos homens, para que se examinem e resolvam no confronto de vários pareceres. Acostumem-se, por fim, a prestar auxílio a toda a iniciativa apostólica e missionária da sua comunidade eclesial na medida das próprias forças.
Cultivem o sentido de diocese, de que a paróquia é como que uma célula, e estejam sempre prontos, à voz do seu pastor, a somar as suas forças às iniciativas diocesanas. Mas, para responder às necessidades das cidades e das regiões rurais (3), não confinem a sua cooperação dentro dos limites da paróquia ou da diocese, mas esforcem-se por estendê-la aos campos interparoquial, interdiocesano, nacional ou internacional. Tanto mais que a crescente migração de povos, o incremento de relações mútuas e a facilidade de comunicações já não permitem que parte alguma da sociedade permaneça fechada em si. Assim devem interessar-se pelas necessidades do Povo de Deus disperso por toda a terra. Em primeiro lugar, façam suas as obras missionárias, prestando auxílios materiais ou mesmo pessoais. Pois é dever e honra dos cristãos restituir a Deus parte dos bens que d'Ele recebem.


A família


11. O criador de todas as coisas constituiu o vínculo conjugal princípio e fundamento da sociedade humana e fê-lo, por sua graça, sacramento grande em Cristo e na Igreja (cfr. Ef. 5, 32). Por isso, o apostolado conjugal e familiar tem singular importância tanto para a Igreja como para a sociedade civil.
Os esposos cristãos são cooperadores da graça e testemunhas da fé um para com o outro, para com os filhos e demais familiares. Eles são os primeiros que anunciam aos filhos a fé e os educam. Formam-nos, pela palavra e pelo exemplo, para a vida cristã e apostólica. Ajudam-nos com prudência a escolher a sua vocação e fomentam com todo o cuidado a vocação de consagração porventura neles descoberta.
Foi sempre dever dos esposos e hoje é a maior incumbência do seu apostolado: manifestar e demonstrar, pela sua vida, a indissolubilidade e a santidade do vínculo matrimonial; afirmar vigorosamente o direito e o dever próprio dos pais e tutores de educar cristãmente os filhos; defender a dignidade e legítima autonomia da família. Cooperem, pois, eles e os outros cristãos, com os homens de boa vontade para que estes direitos sejam integralmente assegurados na legislação civil. No governo da sociedade, tenham-se em conta as necessidades familiares quanto à habitação, educação dos filhos, condições de trabalho, seguros sociais e impostos. Ao regulamentar a migração salve-se sempre a convivência doméstica (4).
Foi a própria família que recebeu de Deus a missão de ser a primeira célula vital da sociedade. Cumprirá essa missão se se mostrar, pela piedade mútua dos seus membros e pela oração feita a Deus em comum, como que o santuário doméstico da Igreja; se toda a família se inserir no culto litúrgico da Igreja e, finalmente, se a família exercer uma hospitalidade actuante e promover a justiça e outras boas obras em serviço de todos os irmãos quê sofrem necessidade. Podem enumerar-se, entre as várias obras de apostolado familiar, as seguintes: adoptar por filhos crianças abandonadas, receber com benevolência estrangeiros, coadjuvar no regime das escolas, auxiliar os adolescentes com conselhos e meios materiais, ajudar os noivos a prepararem-se melhor para o matrimónio, colaborar na catequese, auxiliar os esposos e as famílias que se encontram em crise material ou moral, proporcionar aos velhos não só o necessário, mas também fazê-los participar, com equidade, dos frutos do progresso económico.
As famílias cristãs, pela coerência de toda a sua vida com o Evangelho e pelo exemplo que mostram do matrimónio cristão, oferecem ao mundo um preciosíssimo testemunho de Cristo, sempre e em toda a parte, mas sobretudo naquelas regiões em que se lançam as primeiras sementes do Evangelho ou em que a Igreja está nos começos ou atravessa alguma crise grave (5).
Pode ser oportuno que as famílias se, unam em certas associações para mais fàcilmente poderem atingir os fins do seu apostolado (6).


Os jovens


12. Os jovens exercem na sociedade de hoje um influxo da maior importância (7). As condições em que vivem, os hábitos mentais e até as relações com a própria família estão profundamente mudadas. É frequente passarem com demasiada rapidez a uma condição social e económica nova. Por um lado, cresce cada vez mais a sua importância social e até política; por outro, parecem incapazes de assumir convenientemente as novas tarefas.
Este acréscimo de influência na sociedade exige deles uma actividade apostólica correspondente. Aliás, a sua própria índole natural os dispõe para ela. Com o amadurecimento da consciência da própria personalidade, estimulados pelo ardor da vida e pela actividade transbordante, assumem a própria responsabilidade e desejam tomar a parte activa que lhes compete na vida social e cultural. Se este zelo é penetrado pelo espírito de Cristo e animado pela obediência e pelo amor para com os pastores da Igreja, podemos esperar dele frutos muito abundantes. Eles mesmos devem ser os primeiros e imediatos apóstolos da juventude e exercer por si mesmos o apostolado entre eles, tendo em conta o meio social em que vivem (8).
Os adultos procurem estabelecer com os jovens um diálogo amigo que permita a ambas as partes, superando a distância de idades, conhecerem-se mùtuamente e comunicarem uns aos outros as próprias riquezas. Estimulem os adultos a juventude ao apostolado, primeiro pelo exemplo e, dada a ocasião, por conselhos prudentes e ajuda eficaz. E os jovens mostrem para com os mais velhos respeito e confiança. E, ainda que por natureza são inclinados a novidades, tenham, contudo, na devida estima aquelas tradições que são válidas.
Também as crianças têm a sua própria actuação apostólica. Segunda as suas forças, são em verdade testemunhos vivos de Cristo entre os companheiros.


O apostolado social


13. O apostolado no meio social, isto é, o empenho em informar de espírito cristão a mentalidade e os costumes, as leis e estruturas da comunidade em que se vive, são incumbência e encargo de tal modo próprios dos leigos que nunca poderão ser plenamente desempenhados por outros. Neste campo, podem os leigos exercer um apostolado de semelhante para com semelhante. Aí completam o testemunho da vida pelo testemunho da palavra (9). Nesse campo do trabalho, da profissão, do estudo, da residência, do tempo livre ou da associação, são eles os mais aptos para ajudar os seus irmãos.
Os leigos realizam esta missão da Igreja no mundo, antes de tudo, por aquela coerência da vida com a fé, pela qual se tornam luz do mundo; pela honestidade nos negócios, com a qual a todos atraem ao amor da verdade e do bem e, finalmente, a Cristo e à Igreja; pela caridade fraterna que, fazendo-os participar das condições de vida, dos trabalhos, dos sofrimentos e aspirações de seus irmãos, prepara insensivelmente todos os corações para a acção da graça salutar; por aquela plena consciência da participação que devem ter na construção da sociedade, a qual os leva a esforçarem-se por desempenhar com magnanimidade cristã a actividade doméstica, social e profissional. Assim, o seu modo de agir penetra pouco a pouco no meio de vida e de trabalho.
Este apostolado deve abranger todos aqueles que aí se encontram e não excluir nenhum bem espiritual ou temporal que possam fazer. Mas os verdadeiros apóstolos não se contentam só com esta acção e esforçam-se por anunciar Cristo ao próximo também por meio da palavra. E que muitos homens só por meio de seus companheiros leigos podem ouvir o Evangelho e conhecer Cristo.


O apostolado na ordem nacional e internacional


14. Um imenso campo de apostolado se abre na ordem nacional e internacional, em que são sobretudo os leigos os administradores da sabedoria cristã. Os católicos sintam-se obrigados a promover o bem comum na dedicação à pátria e no fiel cumprimento dos deveres civis, e façam valer o peso da sua opinião de modo a que o poder civil se exerça com justiça e as leis correspondam aos preceitos morais e ao bem comum. Os católicos peritos nos negócios públicos e firmes, como devem ser, na fé e doutrina cristã, não recusem participar neles uma vez que, exercendo-os dignamente, podem atender ao bem comum e, ao mesmo tempo, abrir caminho ao . Evangelho.
Empenhem-se os católicos em cooperar. com todos os homens de boa vontade para promover tudo o que é verdadeiro, tudo o que é justo, tudo o que é santo, tudo o que é digno de ser amado (cfr. Fil. 4,8). Dialoguem com eles, indo ao seu encontro com prudência e bondade. E investiguem em conjunto o modo de organizar as instituições sociais e públicas segundo o espírito do Evangelho.
Entre os sinais do nosso tempo, é digno de especial menção aquele crescente e inelutável sentido de solidariedade entre todos os povos que o apostolado dos leigos tem por encargo promover activamente e converter em sincero e verdadeiro afecto fraternal. Além disso, devem os leigos ter consciência da realidade internacional e das questões e soluções, doutrinais ou práticas, que nela se originam, sobretudo quanto aos povos em desenvolvimento (10).
Lembrem-se todos aqueles que trabalham em nações estrangeiras ou lhes prestam auxílio, que as relações entre os povos devem ser um verdadeiro convívio fraterno em que ambas as partes simultânamente dão e recebem. Aqueles, porém, que viajam ou por causa de obras internacionais, ou por negócios ou por motivo de descanso, lembrem-se que são também, em toda a parte, pregoeiros itinerantes de Cristo e procedam como tais.


CAPÍTULO IV


AS VÁRIAS FORMAS DO APOSTOLADO


Introdução: apostolado individual ou associado
15. Os leigos podem exercer a sua acção apostólica quer como indivíduos quer unidos em diversas comunidades e associações.


Necessidade e natureza do apostolado individual
16. O apostolado individual que deriva com abundância da fonte de uma vida verdadeiramente cristã (cfr. Jo. 4,14), é origem e condição de todo o apostolado dos leigos, mesmo do associado, nem nada o pode substituir.
A este apostolado, sempre e em toda aparte proveitoso e em certas circunstâncias o único conveniente e possível, são chamados e, por isso, obrigados todos os leigos, de qualquer condição; ainda que não se lhes proporcione ocasião ou possibilidade de cooperar nas associações.
São muitas as formas de apostolado pelas quais os leigos edificam a Igreja, santificam o mundo e o vivificam em Cristo.
A forma peculiar do apostolado individual, e sinal muito acomodado também aos nossos tempos, porque manifesta Cristo vivo nos seus fiéis, é o testemunho de toda a vida laical que flui da fé, esperança e caridade. Porém, pelo apostolado da palavra, em certas circunstâncias absolutamente necessário, os leigos anunciam a Cristo, expõem a sua doutrina, difundem-na segundo a sua própria condição e capacidade, e professam-na com fidelidade.
Além disso, como cidadãos deste mundo, os leigos, ao cooperarem na construção e governo da ordem temporal, devem, na vida familiar, profissional, cultural e social, buscar, à luz da fé, normas de acção mais elevadas e manifestá-las aos outros oportunamente, conscientes de que assim se tornam cooperadores de Deus criador, redentor e santificador, e Lhe dão glória.
Finalmente, vivifiquem os leigos a sua vida com a caridade e mostrem-no por obras na medida do possível.
Lembrem-se todos que pelo culto público e pela oração, pela penitencia, pelos trabalhos e livre aceitação das agruras da vida; pelas quais se conformam a Cristo paciente (cfr. 2 Cor. 4,10; Col. 1,24), podem atingir todos os homens e contribuir para a salvação de todo o mundo.


O apostolado individual em circunstâncias especiais


17. Este apostolado individual é urgentemente necessário naquelas regiões em que a liberdade da Igreja é gravemente impedida. Nestas circunstâncias dificílimas, os leigos, suprindo, na medida do possível, o sacerdote, põem em risco a própria liberdade e, às vezes, a vida. Ensinam aos que os cercam a doutrina cristã, formam-nos na vida religiosa e na mentalidade católica, induzem-nos a frequência dos sacramentos e fomentam a piedade, sobretudo a eucarística (1). O sagrado Concílio dá graças dc fundo do coração a Deus que não deixa de suscitar, também em nossos dias, leigos de fortaleza heróica no meio das perseguições, e abraça-os com afecto paterno e ânimo agradecido.
O apostolado individual tem especial campo de acção nas regiões onde os católicos são poucos e dispersos. Os leigos, que exercem nelas só apostolado individual pelas causas acima mencionadas ou por razões especiais, mesmo nascidas da própria actividade profissional, reunam-se oportunamente para dialogar em grupos menores, sem forma estrita de instituição ou organização, de modo que sempre se manifeste aos outros o sinal da comunidade da Igreja como verdadeiro testemunho de amor. Deste modo, pela amizade e pela comunicação de experiências e com a , ajuda espiritual mútua, fortalecem-se para superar as dificuldades da vida e da acção demasiado isolada e produzir mais abundantes frutos de apostolado.


Importância das formas associadas


18. Os fiéis são chamados a exercer o apostolado individual nas diversas condições da sua vida. Lembrem-se, contudo, que o homem é, por natureza, social, e que aprouve ao Senhor unir um Povo de Deus (cfr. 1 Ped. 2, 5-10) e num corpo (cfr. 1 Cor. 12,12) os que crêem em Cristo. Portanto, o apostolado em associação responde com fidelidade à exigência humana e cristã dos fiéis e é, ao mesmo tempo, sinal da comunhão e da unidade da Igreja em Cristo que disse: «Onde estão dois ou três reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles (Mt. 18,20).
Os fiéis exerçam, por conseguinte, o seu apostolado trabalhando para um só fim (2). Sejam apóstolos assim nas suas comunidades familiares como nas paróquias e dioceses, as quais exprimem a índole comunitária do apostolado. Exerçam-no também nas associações livres que resolverem formar.
O apostolado em associação é de grande importância também porque, nas comunidades eclesiais e nos vários meios, o apostolado exige com frequência ser realizado mediante a acção comum. As associações criadas para a acção apostólica comum fortalecem os seus membros e formam-nos para o apostolado. Além disso, distribuem ordenadamente e orientam o seu trabalho apostólico, de modo que se podem esperar daí frutos muito mais abundantes do que se agisse cada um por sua conta.
Nas circunstâncias presentes, porém, é absolutamente necessário que se robusteça a forma associada e organizada do apostolado no campo de actividade dos leigos. É que só a estreita união das forças é capaz de conseguir plenamente os fins do apostolado de hoje e de defender com eficácia os seus bens (3). Neste ponto é particularmente importante que o apostolado atinja também a mentalidade comum e as condições sociais daqueles a quem se dirige. Doutro modo, não poderão, muitas vezes, resistir à pressão da opinião pública ou das instituições.


Multiplicidade de formas do apostolado associado


19. Há uma grande variedade de associações de apostolado (4). Umas propõem-se o fim apostólico geral da Igreja. Outras, de modo particular, fins de evangelização e santificação. Outras, ainda, têm como fim animar cristãmente a ordem temporal. Finalmente, algumas dão testemunho de Cristo, de modo especial, pelas obras de misericórdia e de caridade.
Entre estas associações são de considerar, antes de mais, aquelas que fomentam e promovem uma unidade mais íntima entre a vida prática dos membros e a sua fé. As associações não têm em si o seu fim, mas devem servir à missão que a Igreja tem de cumprir para com o mundo. A sua força apostólica depende da conformidade com os fins da Igreja e do testemunho cristão e espírito evangélico de cada um dos membros e de toda a associação.
O dever universal da missão da Igreja, dado o progresso das instituições e, ao mesmo tempo, o impulso do desenvolvimento da sociedade moderna, exige que as iniciativas apostólicas dos católicos aperfeiçoem cada vez mais as formas associadas no campo internacional. As Organizações Católicas Internacionais conseguirão melhor o seu fim se as associações que as formam e os seus membros a elas se unirem mais intimamente.
Respeitada a devida relação com a autoridade eclesiásticas (5), os leigos têm o direito de fundar associações (6), governá-las, e, uma vez fundadas, dar-lhes um nome. Deve-se, contudo, evitar a dispersão de forças que se verifica se se promovem, sem razão suficiente, novas associações e obras, ou se se mantêm, sem utilidade, associações ou métodos obsoletos. Nem sempre será oportuno que formas criadas numa nação sejam trasladadas, sem critério, para outras (7).


A acção católica


20. Há não poucos decénios, em muitas nações, os leigos, cada vez mais consagrados ao apostolado, uniram-se em várias formas de acção e associação que, em união mais estreita com a Hierarquia, se dedicaram e dedicam a fins especificamente apostólicos. Entre estas e outras instituições semelhantes mais antigas, merecem especial menção as que, seguindo embora diferentes métodos de acção, tendo sido justamente recomendadas e fomentadas pelos Sumos Pontífices e por muitos Bispos, receberam deles o nome de Acção Católica e, com muita frequência, foram declaradas como cooperação dos leigos no apostolado hierárquico(8).
Quer tenham o nome de Acção Católica quer outro, estas formas de apostolado que exercem em nossos dias uma valiosa acção apostólica são constituídas pelo conjunto das seguintes características:
a) O fim imediato de tais organizações é o fim apostólico da Igreja, isto é, ordenam-se à evangelização e santificação dos homens e à formação cristã da sua consciência, de modo a poderem imbuir do espírito do evangelho as várias comunidades e os vários meios.
b) Os leigos, cooperando a seu modo com a Hierarquia, contribuem com a sua experiência e assumem a sua responsabilidade no governo destas organizações, no estudo das condições em que a acção pastoral da Igreja se deve exercer e na elaboração e execução dos planos a realizar.
c) Os leigos agem unidos como um corpo orgânico, para que se manifeste com maior evidência a comunidade da Igreja e o apostolado seja mais eficaz.
d) Os leigos, quer se ofereçam espontâneamente quer sejam convidados à acção e directa colaboração com o apostolado hierárquico, trabalham sob a superior orientação da mesma Hierarquia, a qual pode sancionar essa cooperação com um mandato explícito.
As organizações nas quais, a juízo da Hierarquia, se encontram estas características tomadas em conjunto, devem ser consideradas Acção Católica, ainda que, por exigências de lugar ou de povos, assumam formas e nomes diversos.
O sagrado Concílio recomenda insistentemente estas instituições que correspondem, certamente, às necessidades do apostolado da Igreja em muitas nações. E convida os sacerdotes e leigos que nelas trabalham a tornarem cada vez mais realidade as características acima mencionadas e a cooperarem sempre fraternalmente, na Igreja, com as outras formas de apostolado.


Apreço das associações


21. Tenham-se na devida estima todas as associações de apostolado. Mas aquelas que a Hierarquia, segundo as necessidades do tempo e do lugar, louvar, recomendar ou mandar instituir como mais urgentes, devem ser tidas em alto apreço e ser promovidas pelos sacerdotes, religiosos e leigos, segundo a maneira que lhes é própria. Entre elas, porém, devem-se hoje contar sobretudo as associações ou agrupamentos internacionais de católicos.


Leigos que se entregam com título especial ao serviço da Igreja


22. São dignos de especial honra e recomendação na Igreja aqueles leigos, solteiros ou casados, que se dedicam, perpétua ou temporàriamente, com a sua competência profissional, ao serviço das instituições e suas actividades. É de grande alegria para a Igreja que cresça cada vez mais o número de leigos que prestam o seu serviço às associações e obras de apostolado dentro da própria nação, ou no campo internacional ou, sobretudo, nas comunidades católicas das missões e das Igrejas mais recentes.
Recebam os pastores da Igreja estes leigos de bom grado e com ânimo reconhecido e esforcem-se por que a sua condição corresponda, quanto possível, às exigências da justiça, da equidade e da caridade, principalmente no que respeita ao seu honesto sustento e das suas famílias e por que recebam a necessária formação e sintam consolação e estímulo espiritual.


CAPÍTULO V


A ORDEM A GUARDAR NO APOSTOLADO


Introdução: o apostolado hierárquico, necessário na Igreja


23. O apostolado dos leigos, quer ele seja exercido pelos fiéis individualmente quer em associação, deve-se integrar ordenadamente no apostolado de toda a Igreja. Mais ainda, a união com aqueles que o Espírito Santo pôs à frente da Igreja de Deus (cfr. Act. 20, 28) constitui elemento essencial do apostolado cristão. E não é menos necessária a cooperação entre as diversas iniciativas apostólicas, que devem ser convenientemente dirigidas pela Hierarquia.
Com efeito, para promover o espírito de união, que fará brilhar em todo o apostolado da Igreja a caridade fraterna e levará à consecução dos fins comuns evitando as emulações tão perniciosas, requere-se a estima recíproca de todas as formas de apostolado na Igreja, e a sua apta coordenação no respeito pela índole própria de cada uma (1).
Isto é da máxima conveniência, quando uma determinada acção na Igreja requer a harmonia e cooperação apostólica de ambos os cleros, dos religiosos e dos leigos.


Relações com a Hierarquia


24. Compete à Hierarquia fomentar o apostolado dos leigos, fornecer os princípios e os auxílios espirituais, ordenar para bem comum da Igreja o exercício do mesmo apostolado, e vigiar para que se conservem a doutrina e a ordem.
O apostolado dos leigos admite diversos modos de relação com a Hierarquia, segundo as suas várias formas e seus objectivos.
Assim, existem na Igreja muitas iniciativas apostólicas nascidas da livre escolha dos leigos e dirigidas com o seu prudente critério. Em determinadas circunstâncias, a missão da Igreja pode realizar-se melhor por meio de tais iniciativas, e daí o serem com frequência louvadas e recomendadas pela Hierarquia (2). No entanto, nenhuma iniciativa apostólica se pode chamar católica se não tiver a aprovação da legítima autoridade eclesiástica.
Certas formas de apostolado dos leigos são expressamente reconhecidas pela Hierarquia, de diversos modos.
Além disso, a autoridade eclesiástica, tendo em conta as exigências do bem comum da Igreja, pode escolher de entre as várias associações e iniciativas apostólicas com um fim directamente espiritual, algumas em particular, e promovê-las dum modo especial, assumindo sobre elas uma maior responsabilidade. Deste modo, a Hierarquia, ordenando o apostolado de diversas maneiras segundo as circunstâncias, vai unindo mais intimamente ao seu próprio múnus apostólico uma ou outra das suas formas, respeitando, porém, sempre a natureza e a distinção de ambas as partes, e sem com isso se tirar aos leigos a necessária liberdade de acção. Em vários documentos eclesiásticos se dá a este acto da Hierarquia o nome de mandato.
Finalmente, a Hierarquia confia aos leigos certas tarefas mais intimamente ligadas ao múnus pastoral, como exemplo, no ensino da doutrina cristã, nalguns actos litúrgicos e na cura de almas. Em virtude desta missão, os leigos ficam plenamente sujeitos à superior direcção eclesiástica, no respeitante ao desempenho desse encargo.
Quanto às obras e instituições da ordem temporal, pertence à Hierarquia eclesiástica ensinar e interpretar autênticamente os princípios morais que se devem aplicar nos assuntos temporais. Compete-lhe igualmente julgar, depois de bem considerar todas as coisas, e servindo-se do auxílio dos peritos, da conformidade de tais obras e instituições com os princípios morais e determinar o que for necessário para conservar e promover os bens de ordem sobrenatural.


Ajuda que deve prestar o clero ao apostolado dos leigos


25. Tanto os Bispos como os párocos e demais sacerdotes de ambos os cleros, devem ter presente que o direito e dever de exercer o apostolado são comuns a todos os fiéis, clérigos e leigos, e que também estes últimos têm um papel a desempenhar na edificação da Igreja (3). Tratem, pois, fraternalmente com os leigos na Igreja e para a Igreja, e tenham deles cuidado especial nas suas obras apostólicas (4).
Para ajudar os leigos nas suas diversas formas de apostolado, escolham-se diligentemente sacerdotes idóneos e bem formados (5). Os que se consagram a este ministério, por missão recebida da Hierarquia, representam-na na sua acção pastoral. Fomentem, pois, as convenientes relações dos leigos com a mesma, permanecendo sempre fiéis ao espírito e doutrina da Igreja. Dediquem-se a fomentar a vida espiritual e o sentido apostólico das associações católicas que lhes foram confiadas. Assistam com prudente conselho as suas actividades apostólicas e favoreçam as suas iniciativas. Investiguem atentamente por meio do diálogo contínuo com os leigos quais as formas de tornar mais frutuosa a sua acção apostólica; e promovam o espírito de união dentro da mesma associação, e desta com as demais.
Finalmente, os religiosos e as religiosas tenham em apreço as obras apostólicas dos leigos; consagrem-se de boa vontade a promover as obras destes, segundo o espírito e normas dos próprios Institutos (6); e procurem apoiar, auxiliar, e completar as funções sacerdotais.


Certos meios que servem para a mútua cooperação


26. Enquanto for possível, haja em todas as dioceses conselhos que ajudem a obra apostólica da Igreja, quer no campo da evangelização e santificação quer no campo caritativo, social e outros, onde os clérigos e os religiosos colaborem dum modo conveniente com os leigos. Tais órgãos poderão servir para coordenar as diversas associações de leigos e suas iniciativas apostólicas, respeitando a índole e autonomia própria de cada uma (7).
Se for possível, haja também organismos semelhantes no âmbito paroquial, interparoquial, interdiocesano, bem como no plano nacional ou internacional (8).
Além disso, crie-se junto da santa Sé algum Secretariado especial para ajudar e impulsionar o apostolado dos leigos, como centro que, por meios aptos, forneça informações sobre as várias iniciativas apostólicas dos leigos, se dedique a investigar os problemas actuais neste campo, e preste ajuda com o seu conselho à Hierarquia e aos leigos, nas suas obras de apostolado. Neste Secretariado deverão participar os diversos movimentos e iniciativas apostólicas de leigos existentes em todo o mundo, colaborando com os leigos também os clérigos e religiosos.


Cooperação com outros cristãos e não-cristãos


27. O comum património evangélico, e o dever comum do testemunho cristão que daí nasce, aconselham e com frequência exigem a colaboração dos católicos com os outros cristãos. Esta há-de exercer-se pelos indivíduos e pelas comunidades, em actuações singulares e em associações, tanto no plano nacional como no internacional (9).
Os valores humanos comuns pedem com frequência uma cooperação semelhante dos cristãos, que procuram fins apostólicos, com outros que, embora não professem a religião cristã, reconhecem, contudo, esses valores.
Por meio desta cooperação dinâmica e prudente (10), de grande importância nas actividades temporais, dão os leigos testemunho de Cristo, Salvador do mundo, e da unidade da família humana.


CAPÍTULO VI


A FORMAÇÃO PARA O APOSTOLADO


Necessidade da formação para o apostolado


28. A plena eficácia do apostolado só se pode alcançar com uma formação multiforme e integral. Exigem-na tanto o contínuo progresso espiritual e doutrinal do próprio leigo, como as diversas circunstâncias de coisas, pessoas e encargos a que a sua actividade se deve acomodar. Esta formação deve-se apoiar sobre os fundamentos afirmados e expostos por este sagrado Concílio noutros lugares(1). Além da formação comum a todos os cristãos, não poucas formas de apostolado requerem uma formação peculiar e específica, por causa da diversidade de pessoas e circunstâncias.


Princípios da formação dos leigos para o apostolado


29. Uma vez que os leigos têm um modo próprio de participar na missão da Igreja, a sua formação apostólica recebe uma característica especial que lhe vem da mesma índole secular própria do laicado e da sua espiritualidade.
A preparação para o apostolado supõe uma formação humana completa e adaptada à maneira de ser e circunstâncias próprias de cada um. Com efeito, o leigo, conhecendo bem o mundo actual, deve ser um membro da sociedade em que vive e ao nível da sua cultura.
Primeiro que tudo, aprenda o leigo a realizar a missão de Cristo e da Igreja, vivendo da fé no mistério divino da criação e da redenção, guiado pelo Espírito Santo vivificador do Povo de Deus, que impele todos os homens a amar a Deus Pai, e n'Ele, o mundo e os homens. Esta formação deve ser considerada como fundamento e condição de todo e qualquer apostolado fecundo.
Além da formação espiritual, requere-se uma sólida preparação doutrinal, teológica, ética e filosófica, de harmonia com a idade, condição e capacidade. Nem se descure de modo nenhum a importância da cultura geral e da formação prática e técnica.
Para cultivar as boas relações humanas, é necessário promover os valores verdadeiramente humanos, a começar pela arte de conviver e cooperar fraternalmente, bem como a de estabelecer diálogo com os outros.
Visto que a formação para o apostolado não pode consistir ùnicamente na instrução teórica, devem ir aprendendo gradual e prudentemente, desde o começo da formação, a ver, julgar e agir todas as coisas à luz da fé, a formar-se e aperfeiçoar-se com os outros por meio da acção e a entrar assim ao serviço activo da Igreja (2). Esta formação, que deve aperfeiçoar-se continuamente por causa da crescente maturidade da pessoa humana e em razão da evolução dos problemas, exige um conhecimento cada vez mais profundo e uma acção adaptada. Ao realizar todas estas eigências da formação, devem ter-se sempre em conta a unidade e a integridade da pessoa humana, de tal modo que se ressalve e desenvolva a sua harmonia e equilíbrio.
Deste modo, o leigo insere-se profunda e activamente na própria ordem temporal, assumindo com eficiência a sua parte na solução dos seus problemas; ao mesmo tempo, como membro vivo e testemunha da Igreja, torna-a presente e activa no meio das coisas temporais (3).


A quem pertence formar para o apostolado


30. A formação para o apostolado deve começar desde os princípios da educação infantil. Sejam, porém, iniciados no apostolado e imbuídos deste espírito particularmente os adolescentes e os jovens. Esta formação deve ser aperfeiçoada durante toda a vida, de acordo com as exigências dos encargos assumidos. E claro, portanto, que aqueles a quem compete educar cristãmente têm igualmente o dever de formar em ordem ao apostolado.
Pertence aos pais ir dispondo os filhos, desde a infância, para conhecerem o amor de Deus por todos os homens, e ir-lhes inculcando pouco a pouco, sobretudo com o exemplo, a preocupação pelas necessidades materiais e espirituais do próximo. Que toda a família se torne, pois, na. sua vida íntima, como que um estágio do apostolado.
Além disso, as crianças devem ser educadas de tal modo que, transcendendo os limites da família, se abram tanto às comunidades eclesiais como às civis. Sejam de tal modo integradas na comunidade local da paróquia que nela possam tomar consciência da sua qualidade de membros vivos e activos do Povo de Deus. Os sacerdotes, porém, na catequese e na pregação, na direcção espiritual, bem como em outras actividades pastorais, tenham em conta a formação em ordem ao apostolado.
Compete também às escolas, colégios e outras instituições católicas destinadas à formação, fomentar nos jovens o sentido católico e a acção apostólica. No caso de faltar esta formação, quer seja porque os jovens não frequentam essas escolas, quer por outra causa, então cuidem mais dela os pais, os pastores de almas e as associações apostólicas. Os professores, porém, e os educadores, que, por vocação e ofício, exercem uma superior forma de apostolado dos leigos, estejam impregnados da ciência necessária e das técnicas pedagógicas, para poder realizar eficazmente essa educação.
Do mesmo modo, os grupos e as associações de leigos, quer se dediquem ao apostolado, quer a outros fins sobrenaturais, devem fomentar com diligência e assiduidade a formação para o apostolado, segundo o próprio fim e modalidades (4). São elas, muitas vezes, o caminho ordinário duma preparação conveniente em ordem ao apostolado. Com efeito, nelas se realiza uma formação doutrinal, espiritual e prática. Os seus membros, constituindo pequenos grupos com os companheiros e amigos, consideram os métodos e os frutos da sua actividade apostólica, e confrontam com o Evangelho a sua vida quotidiana.
Deve-se orientar esta formação de modo a ter-se em conta todo o apostolado dos leigos, que deverá ser exercido não só entre os grupos das associações, mas também em todas as circunstâncias, através de toda a vida, sobretudo profissional e social. Mais ainda: cada um deve preparar-se activamente para o apostolado, o que se torna mais urgente na idade adulta. Com efeito, à medida que se avança na idade, revela-se mais cada um e assim pode descobrir melhor os talentos com que Deus enriqueceu a sua alma, e exercitar mais eficazmente os carismas que lhe foram dados pelo Espírito Santo para bem dos seus irmãos.


Formação específica para o apostolado


31. As diversas formas de apostolado exigem também uma preparação particularmente adequada.
a) Quanto ao apostolado em ordem à evangelização e santificação dos homens, devem os leigos receber uma formação especial para estabelecerem o diálogo com os outros, quer crentes quer não crentes, e comunicarem a todos a mensagem de Cristo(5).
Como, porém, em nossos dias se vão espalhando largamente por toda a parte várias formas de materialismo, até mesmo entre os católicos, convém que os leigos não só aprendam com maior diligência a doutrina católica, especialmente aqueles pontos que são objecto de controvérsia, mas também dêem testemunho de vida evangélica contra qualquer forma de materialismo.
b) Quanto à edificação cristã da ordem temporal, sejam os leigos bem instruídos sobre o verdadeiro significado e valor dos bens temporais, quer em si mesmos considerados, quer no que diz respeito a todos os fins da pessoa humana. Exercitem-se no recto uso das coisas e na organização das instituições, atendendo sempre ao bem comum segundo os princípios da doutrina moral e social da Igreja. Aprendam os leigos, antes de mais, os princípios da doutrina social e as suas conclusões, de modo a tornarem-se aptos quer para prestarem o seu contributo ao progresso da doutrina quer para aplicá-los convenientemente aos casos particulares (6).
c) Visto que as obras de caridade e misericórdia dão um esplêndido testemunho de vida cristã, deve também a formação apostólica levar ao seu exercício, para que os fiéis aprendam, logo desde a infância, a compadecer-se dos pobres e necessitados e a ajudá-los com generosidade(7).


Meios de formação


32. Para os leigos consagrados ao apostolado, existem já muitos meios por exemplo, sessões, congressos, recolecções, exercícios espirituais, reuniões frequentes, conferências, livros, revistas para se conseguir um mais perfeito conhecimento da Sagrada Escritura e da doutrina católica, para alimentar a vida espiritual e ainda para conhecer o estado do mundo e para encontrar e cultivar métodos adaptados (8).
O sagrado Concílio alegra-se com essas iniciativas, já florescentes nos ambientes em que este se exerce.
Para este fim foram também criados centros ou institutos superiores que já produziram óptimos frutos.
O sagrado Concílio alegra-se com essas iniciativas, já florescentes em algumas partes, e deseja que se promovam noutros lugares onde forem necessárias.
Criem-se, além disso, centros de documentação e de estudo não só de teologia, mas também de antropologia, psicologia, sociologia, metodologia, para fomentar mais as qualidades dos leigos, homens e mulheres, jovens e adultos, em todos os campos do apostolado.


EXORTAÇÃO


Exortação à generosidade


33. Por isso, o sagrado Concílio pede instantemente no Senhor a todos os leigos que respondam com decisão de vontade, ânimo generoso e e disponibilidade de coração à voz de Cristo, que nesta hora os convida com maior insistência, e ao impulso do Espírito Santo. Os mais novos tomem como dirigido a si de modo particular este chamamento, e recebam-no com alegria e magnanimidade. Com efeito, é o próprio Senhor que, por meio deste sagrado Concílio, mais uma vez convida todos os leigos a que se unam a Ele cada vez mais intimamente, e sentindo como próprio o que é d'Ele (cfr. Fil. 2,5), se associem à Sua missão salvadora. É Ele quem de novo os envia a todas as cidades e lugares aonde há-de chegar (cfr. Lc. 10,1); para que, nas diversas formas e modalidades do apostolado único da Igreja, se tornem verdadeiros cooperadores de Cristo, trabalhando sempre na obra do Senhor com plena consciência de que o seu trabalho não é vão no Senhor (cfr. 1 Cor. 15,28).
                                          Vaticano, 18 de Novembro de 1965.
                                                       PAPA PAULO VI
Texto retirado do Site:

Ad Gentes - às Nações

DECRETO AD GENTES
SOBRE A ATIVIDADE MISSIONÁRIA DA IGREJA
PROÉMIO


A vocação missionária da Igreja


1. A Igreja, enviada por Deus a todas as gentes para ser «sacramento universal de salvação», (1) por íntima exigência da própria catolicidade, obedecendo a um mandato do seu fundador (2), procura incansàvelmente anunciar o Evangelho a todos os homens. Já os próprios Apóstolos em que a Igreja se alicerça, seguindo o exemplo de Cristo, «pregaram a palavra da verdade e geraram as igrejas» (3). Aos seus sucessores compete perpetuar esta obra, para que «a palavra de Deus se propague ràpidamente e seja glorificada (2 Tess. 3,1), e o reino de Deus seja pregado e estabelecido em toda a terra.
No estado actual das coisas, de que surgem novas condições para a humanidade, a Igreja, que é sal da terra e luz do mundo (4), é com mais urgência chamada a salvar e a renovar toda a criatura, para que tudo seja instaurada em Cristo e n'Ele os homens constituam uma só família e um só Povo de Deus.
Por isso, este sagrado Concílio, agradecendo a Deus a grandiosa obra já realizada pelo esforço generoso de toda a Igreja, deseja delinear os princípios da actividade missionária e reunir as forças de todos os fiéis, para que o Povo de Deus, continuando a seguir pelo caminho estreito da cruz, difunda por toda a parte o reino de Cristo, Senhor e perscrutador dos séculos (5), e prepare os caminhos para a sua vinda.


CAPÍTULO I


PRINCÍPIOS DOUTRINAIS


Desígnio do Pai


2. A Igreja peregrina é, por sua natureza, missionária, visto que tem a sua origem, segundo o desígnio de Deus Pai, na «missão» do Filho e do Espírito Santo (6).
Este desígnio brota do «amor fontal», isto é, da caridade de Deus Pai, que, sendo o Princípio sem Princípio de quem é gerado o Filho e de quem procede o Espírito Santo pelo Filho, quis derramar e não cessa de derramar ainda a bondade divina, criando-nos livremente pela sua extraordinária e misericordiosa benignidade, e depois chamando-nos gratuitamente a partilhar da sua própria vida e glória. Quis ser, assim, não só criador de todas as coisas mas também «tudo em todas as coisas» (1 Cor. 15,28), conseguindo simultâneamente a sua glória e a nossa felicidade. Aprouve, porém, a Deus chamar os homens a esta participação na sua vida, não só de modo individual e sem qualquer solidariedade mútua, mas constituindo-os num Povo em que os seus filhos, que estavam dispersos, se congregassem em unidade (7).


Missão do Filho


3. Este desígnio universal de Deus para a salvação do género humano realiza-se não sòmente dum modo quase secreto na mente humana, ou por esforços, ainda que religiosos, pelos quais os homens de mil maneiras buscam. a Deus a ver se conseguem chegar até Ele ou encontrá-l'O, embora Ele não esteja longe de cada um de nós (cfr. Act. 17, 27); com efeito, estes esforços precisam de ser iluminados e purificados, embora, por benigna determinação da providência de Deus, possam algumas vezes ser considerados como pedagogia ou preparação evangélica para o Deus verdadeiro (8). Para estabelecer a paz ou a comunhão com Ele e uma sociedade fraterna entre os homens, apesar de pecadores, Deus determinou entrar de modo novo e definitivo na história dos homens, enviando o seu Filho na nossa carne para, por Ele, arrancar os homens ao poder das trevas e de satanás (9) e n'Ele reconciliar o mundo consigo (10). Constituiu, portanto, herdeiro de todas as coisas Aquele por quem fizera tudo(11), para n'Ele tudo restaurar (12).
Cristo Jesus, de facto, foi enviado ao mundo como verdadeiro mediador entre Deus e os homens. Como é Deus, n'Ele habita corporalmente toda a plenitude da divindade (Col. 2,9); e sendo o novo Adão pela sua natureza humana, é constituído cabeça da humanidade renovada, cheio de graça e de verdade (Jo. l,14). Assim, o Filho de Deus, pelo caminho duma verdadeira Incarnação, veio para fazer os homens participantes da sua natureza divina e, sendo rico, fez-se por nós necessitado para que nos tornássemos ricos da sua pobreza (13). O Filho do Homem não veio para que o servissem, mas para ser ele a servir e para dar até a sua vida em redenção por muitos, isto é, por todos (14). Os santos Padres constantemente proclamam nada estar remido que não tivesse sido primeiro assumido por Cristo (15). Ora ele assumiu por inteiro a natureza humana tal qual ela existe em nós, pobres e miseráveis, rejeitando dela apenas o pecado (16). De si mesmo disse Cristo, a quem o Pai santificou e enviou ao mundo (cfr. Jo. 10,36): «O Espírito do Senhor está sobre mim; por isso me ungiu e me enviou a anunciar a boa nova aos pobres, a sarar os contritos de coração, a proclamar a libertação dos cativos e a restituir a vista aos cegos» (Lc. 4,18). E outra vez: «Veio o Filho do Homem para buscar e salvar o que estava perdido» (Lc. 19,10).
Aquilo que uma vez foi pregado pelo Senhor ou aquilo que n'Ele se operou para salvação do género humano, deve ser proclamado e espalhado até aos confins da terra (17), começando por Jerusalém (18), de modo que tudo quanto foi feito uma vez por todas, pela salvação dos homens, alcance o seu efeito em todos, no decurso dos tempos.


Missão do Espírito Santo


4. Para isso, precisamente, enviou Cristo o Espírito Santo da parte do Pai, para realizar no interior das almas a sua obra salvadora e impelir a Igreja à sua própria dilatação. Não há dúvida de que o Espírito Santo já actuava no mundo antes de Cristo ser glorificado (19). Contudo, foi no dia de Pentecostes, em que desceu sobre os discípulos para ficar para sempre com eles (20), que a Igreja foi pùblicamente manifestada diante duma grande multidão, que a difusão do Evangelho entre os gentios por meio da pregação . teve o seu início, e que, finalmente, a união dos povos numa catolicidade de fé foi esboçada de antemão na Igreja da nova Aliança, a qual fala em todas as línguas e entende e abraça todas as línguas na sua caridade, superando assim a dispersão de Babel (21). Pelo Pentecostes começaram os «actos dos Apóstolos», como pela descida do Espírito Santo sobre Maria fora concebido Cristo, e como pela descida do mesmo Espírito Santo sobre Cristo, quando orava, fora o Senhor impelido à obra do seu ministério (22). O próprio Senhor Jesus, antes de dar livremente a sua vida pelo mundo, de tal maneira dispôs o ministério apostólico e de tal forma prometeu enviar o Espírito Santo, que a ambos associava na tarefa de levar a cabo sempre e em toda a parte a obra da salvação (23). O Espírito Santo é quem «unifica na comunhão e no ministério, e enriquece com diversos dons hierárquicos e carismáticos» (24) toda a Igreja através dos tempos, dando vida às instituições eclesiásticas (25), sendo como que a alma delas, e instilando nos corações dos fiéis aquele mesmo espírito de missão que animava o próprio Cristo. Por vezes precede visivelmente a acção apostólica (26), como também incessantemente a acompanha e dirige de vários modos (27).


A Igreja enviada de Cristo


5. O Senhor Jesus, logo desde o princípio «chamou a Si alguns a quem Ele quis, e escolheu doze para andarem com Ele e para -os mandar a pregar» (Mc. 3,13) (28). Os Apóstolos foram assim a semente do novo Israel e ao mesmo tempo a origem da sagrada Hierarquia. Depois, realizados já definitivamente em Si, pela sua morte e ressurreição, os mistérios da nossa salvação e da renovação do universo, o Senhor, com todo o poder que adquiriu no céu e na terra (29), antes de subir ao Céu (30) fundou a sua Igreja como sacramento de salvação e enviou os seus Apóstolos a todo o mundo tal qual Ele também tinha sido enviado pelo Pai (31), dando-lhes este mandato: «Ide, pois, fazei discípulos de todas as nações, baptizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-as a cumprir tudo quanto vos prescrevi» (Mt. 28, 19-20). «Ide por todo o mundo, proclamai a Boa Nova a toda a criatura. Quem acreditar e for baptizado, será salvo; mas quem não acreditar, será condenado» (Mc. 16,15 ss.). Daí vem à Igreja o dever de propagar a fé e a salvação de Cristo, tanto em virtude do expresso mandamento que dos Apóstolos herdou a Ordem dos Bispos ajudada pelos presbíteros em união com o sucessor de Pedro e sumo pastor da Igreja, como em virtude da vida comunicada aos seus membros por Cristo, «do qual o corpo todo inteiro bem ajustado e coeso por toda a espécie de junturas que o alimentam, com a acção proporcionada a cada membro, realiza o seu crescimento em ordem à própria edificação na caridade» (Ef. 4,16). A missão da Igreja realiza-se pois, mediante a actividade pela qual, obedecendo ao mandamento de Cristo e movida pela graça e pela caridade do Espírito Santo, ela se torna actual e plenamente presente a todos os homens ou povos para os conduzir à fé, liberdade e paz de Cristo, não só pelo exemplo de vida e pela pregação mas também pelos sacramentos e pelos restantes meios da graça, de tal forma que lhes fique bem aberto caminho livre e seguro para participarem plenamente no mistério de Cristo.
Continuando esta missão e explicitando através da história a missão do próprio Cristo, que foi enviado a evangelizar os pobres, a Igreja, movida pelo Espírito Santo, deve seguir o mesmo caminho de Cristo: o caminho da pobreza, da obediência, do serviço e da imolação própria até à morte, morte de que Ele saiu vencedor pela sua ressurreição. Foi assim também que todos os Apóstolos caminharam na esperança completando com muitas tribulações e fadigas o que faltava aos trabalhos de Cristo pelo seu corpo, que é a Igreja (32). Muitas vezes, mesmo, a semente foi o sangue dos cristãos (33).


Actividade missionária da Igreja: seus diversos modos


6. Esta tarefa que deve ser levada a cabo pela Ordem dos Bispos presidida pelo sucessor de Pedro e com a
oração e a cooperação de toda a Igreja, é uma e a mesma em toda a parte, sejam quais forem os condicionalismos, embora difira quanto ao exercício conforme as circunstâncias. Mas as diferenças que nesta actividade da Igreja se têm de reconhecer, não se originam na natureza íntima da «missão», mas nos condicionalismos em que essa «missão» se exerce.
Esses condicionalismos tanto podem depender da Igreja como dos povos, dos agrupamentos ou até dos indivíduos a quem a «missão,, se dirige. A Igreja, de facto, embora de si possua a totalidade ou à plenitude dos meios de salvação, não actua nem pode actuar sempre e imediatamente com todos eles, mas vai por tentativas e por passos na sua acção e no seu esforço de levar a efeito os desígnios de Deus. As vezes até, depois dum avanço, felizmente lançado, vê-se infelizmente obrigada a deplorar de novo uma regressão, ou, pelo menos, a demorar-se num certo estádio de semi-vitalidade e insuficiência. Quanto aos indivíduos, agrupamentos e povos, a esses só gradualmente os atinge e os penetra, e só assim os traz à plenitude católica. A cada condicionalismo e a cada situação devem corresponder acções apropriadas ou meios aptos.
O nome de «missões» dá-se geralmente àquelas actividades características com que os pregoeiros do Evangelho, indo pelo mundo inteiro enviados pela Igreja, realizam o encargo de pregar o Evangelho e de implantar a mesma Igreja entre os povos ou grupos que ainda não crêem em Cristo. Essas «missões» são levadas a efeito pela actividade missionária e exercem-se ordinàriamente em certos territórios reconhecidos pela Santa Sé. O fim próprio desta actividade missionária é a evangelização e a implantação da Igreja nos povos ou grupos em que ainda não está radicada (34). Assim, a partir da semente da palavra de Deus, é necessário que se desenvolvam por toda a parte igrejas autóctones particulares, dotadas de forças próprias e maturidade, com hierarquia própria unida ao povo fiel, suficientemente providas de meios proporcionados a uma vida cristã plena, contribuindo para o bem da Igreja universal. O meio principal desta implantação é a pregação do Evangelho de Jesus Cristo. Para o anunciar, enviou o Senhor pelo mundo inteiro os seus discípulos, a fim de que os homens, uma vez renascidos pela palavra de Deus, fossem agregados pelo Baptismo à Igreja, a qual, como corpo do Verbo encarnado, se nutre e vive da palavra de Deus e do pão eucarístico.
Nesta actividade missionária da Igreja dão-se, por vezes, simultâneamente, situações diversas: a de começo ou implantação, primeiro, e a de crescimento ou juventude, depois. Ultrapassadas estas etapas, não acaba, contudo, a acção missionária da Igreja, mas é às igrejas particulares já constituídas que incumbe o dever de a continuar pregando o Evangelho a todos aqueles que ainda tenham ficado de fora. Há a considerar também que as comunidades em que a Igreja vive, não raras vezes e por variadas causas mudam radicalmente, de maneira a poderem daí advir condições de todo novas. Então, deve a Igreja ponderar se tais condicionalismos não exigem de novo a sua actividade missionária.
Mais: por vezes, as circunstâncias são tais que não há possibilidades, por um tempo, de propor directa e imediatamente a mensagem evangélica: então é evidente que podem os missionários e até devem dar ao menos o testemunho da caridade e da beneficência de Cristo, pacientemente, com prudência e ao mesmo tempo grande confiança. Assim, não só prepararão os caminhos ao Senhor mas até o tornarão já de alguma maneira presente.
É, pois, bem de ver como a actividade missionária dimana intimamente da própria natureza da Igreja, cuja fé salvífica propaga, cuja unidade católica dilatando aperfeiçoa, em cuja apostolicidade se apoia, cujo afecto colegial de sua hierarquia exercita, cuja santidade testemunha, difunde e promove. É bem de ver também que a actividade missionária entre gentios difere tanto da actividade pastoral que se exerce com os fiéis, como das iniciativas pela reunificação dos cristãos. Contudo, ambas estas actividades andam estreitamente ligadas à actividade missionária da Igreja (35): pois a divisão dos cristãos prejudica a santíssima causa de pregar o Evangelho a toda a criatura (36) e fecha a muitos o acesso à fé. Por isso, por uma necessidade missionária, todos os baptizados são chamados a unir-se num rebanho para assim poderem dar um testemunho unânime de Cristo, seu Senhor, perante os gentios. Mas se ainda não podem, de completo acordo, dar testemunho duma só fé, é preciso que, ao menos, estejam animados de mútua estima e caridade.


Actividade missionária da Igreja: suas causas e necessidades


7. A razão desta actividade missionária vem da vontade de Deus, que «quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade. Ora há um só Deus, e um só que é mediador de Deus e dos homens, o homem Cristo Jesus, que se deu a si mesmo como preço de resgate por todos» (l Tim. 2, 4-6), «e não há salvação em nenhum outro» (Act. 4,12). Portanto, é preciso que todos se convertam a Cristo conhecido pela pregação da Igreja e que sejam incorporados, pelo Baptismo, a Ele e à Igreja, seu corpo. O próprio Cristo, aliás, ao inculcar por palavras expressas a necessidade da fé e do Baptismo (37), confirmou também, por isso mesmo, a necessidade da Igreja, na qual os homens entram pelo Baptismo, que é como que a porta de entrada. Por isso, não se poderiam salvar aqueles que, não ignorando que Deus fundou por intermédio de Jesus Cristo a Igreja católica como necessária, não quisessem, apesar disso, entrar nela ou nela perseverar» (38). Por isso também, embora Deus, por caminhos que só Ele sabe, possa conduzir à fé, sem a qual é impossível ser-se-Lhe agradável (39), os homens que ignoram o Evangelho sem culpa sua, incumbem à Igreja, apesar de tudo, a obrigação (40) e o sagrado direito de evangelizar. Daí vem que a actividade missionária conserve ainda hoje e haja de conservar sempre toda a sua eficácia e a sua necessidade.
Por ela incessantemente vai cobrando e organizando as forças para seu crescimento o Corpo místico de Cristo (41). Ao exercício desta actividade são impelidos, sem cessar, os membros da Igreja, pela caridade com que amam a Deus e com que desejam comunicar a todos os homens os bens espirituais tanto da vida presente como da futura.
Finalmente, por esta actividade missionária é Deus plenamente glorificado enquanto os homens por ela recebem, plena e conscientemente, a obra de salvação que Ele em Cristo levou a cabo. E assim se realizam por ela os desígnios de Deus, aos quais Cristo serviu com obediência e amor para glória do Pai que o enviou (42), e para que todo o género humano forme um só Povo de Deus, se una num só corpo de Cristo, e se edifique num só templo do Espírito Santo: o qual, ao restabelecer a concórdia fraterna, vem precisamente ao encontro das aspirações mais íntimas de todos os homens. Finalmente, quando todos os que participam da natureza humana, uma vez regenerados em Cristo pelo Espírito Santo e já na visão unânime da glória de Deus Pai, puderem dizer: «Pai nosso» (43), então se há-de realizar deveras o intento do Criador ao fazer o homem à Sua imagem e semelhança.


Actividade missionária da Igreja na vida e na história humana


8. Também com a própria natureza humana e suas aspirações tem íntima conexão a actividade missionária. Com efeito, ao dar a conhecer Cristo, a Igreja revela, por isso mesmo, aos homens a genuína verdade da sua condição e da sua integral vocação, pois Cristo é o princípio e o modelo da humanidade renovada e imbuída de fraterno amor, sinceridade e espírito de paz, à qual todos aspiram.
Cristo e a Igreja que d'Ele dá testemunho pela pregação evangélica, transcendem todos os particularismos de estirpe ou de nação e, por isso, não podem ser considerados estranhos a ninguém e em nenhuma parte (44). É próprio Cristo é aquela verdade e aquele caminho que a pregação evangélica a todos abre ao levar aos ouvidos de todos as palavras que Ele mesmo disse: «Arrependei-vos e crede no Evangelho» (Mc. 1,15). Porém, como quem não crê já está julgado (45), as palavras de Cristo são, ao mesmo tempo, palavras de juízo e de graça, de morte e de vida. n que só infligindo a morte ao que é velho podemos ter acesso à novidade de vida: e isto, que vale, em primeiro lugar, das pessoas, vale também dos diversos bens deste mundo que estão marcados tanto pelo pecado do homem como pela bênção de Deus: «porque todos pecaram e todos estão privados da glória de Deus» (Rom. 3,23). Por si mesmo e por próprias forças não há ninguém que se liberte do pecado e se eleve acima de si mesmo, ninguém absolutamente que se liberte a si mesmo da sua enfermidade, da sua solidão ou da sua escravidão (46), mas todos precisam de Cristo como modelo, mestre, libertador, salvador, vivificador. De facto, na história humana, mesmo sob o ponto de vista temporal, o Evangelho foi um fermento de liberdade e de progresso e apresenta-se sempre como fermento de fraternidade, de unidade e de paz. Não é sem razão, por isso, que Cristo é celebrado pelos fiéis como «o esperado das nações e o seu salvador» (47).


Carácter escatológico da actividade missionária da Igreja


9. A actividade missionária desenrola-se entre o primeiro e o segundo advento do Senhor, em que a Igreja há-de ser reunida dos quatro ventos como uma colheita, no reino de Deus (48). Mas antes de o Senhor vir, tem de ser pregado o Evangelho a todos os povos (49).
A actividade missionária não é outra coisa, nem mais nem menos, que a manifestação ou epifania dos desígnios de Deus e a sua realização no mundo e na sua história, na qual Deus, pela missão, manifestamente vai tecendo a história da salvação. Pela palavra da pregação e pela celebração dos sacramentos de que a Eucaristia é o centro e a máxima expressão, torna presente a Cristo, autor da salvação. Por outro lado, tudo o que de verdade e de graça se encontrava já entre os gentios como uma secreta presença de Deus, expurga-o de contaminações malignas e restitui-o ao seu autor, Cristo, que destrói o império do demónio e afasta toda a malícia dos pecados. O que de bom há no coração e no espírito dos homens ou nos ritos e culturas próprias dos povos, não só não se perde, mas é purificado, elevado e consumado para glória de Deus, confusão do demónio e felicidade do homem (50). A actividade missionária tende assim para a plenitude escatológica (51): por ela, com efeito, se estende, segundo as dimensões e os tempos que o Pai fixou com o seu próprio poder (52), o Povo de Deus a quem foi dito profèticamente: «Dilata o acampamento das tuas tendas e estende as telas das tuas barracas! Não te acanhes» (Is. 54,2) (53); por ela cresce o Corpo místico até constituir esse homem perfeito, na força da idade, que realiza a plenitude de Cristo (54); por ela se levanta e se vai edificando sobre os alicerces dos Apóstolos e dos profetas e com o próprio Cristo Jesus por pedra angular (Ef. 2,20), o templo espiritual onde Deus é adorado em espírito e verdade (55).


CAPÍTULO II


A OBRA MISSIONÁRIA EM SI MESMA


Introdução: A actividade missionária da Igreja no mundo actual


10. Enviada por Cristo a manifestar e a comunicar a todos os homens e povos a caridade de Deus, a Igreja reconhece que tem de levar a cabo uma ingente obra missionária. É que, na verdade, dois biliões de homens, número que cresce de dia para dia, em grandes e determinados agrupamentos, unidos por laços estáveis de vida cultural, por antigas tradições religiosas, por estreitos vínculos de relações sociais, ou ainda não receberam a mensagem do Evangelho, ou mal ouviram falar dela; dentre eles, uns seguem alguma das grandes religiões, outros permanecem estranhos ao conhecimento de Deus, outros negam expressamente a sua existência, ou até mesmo a atacam. A fim de poder oferecer a todos o mistério de salvação e a vida trazida por Deus, a Igreja deve inserir-se em todos esses agrupamentos, impelida pelo mesmo movimento que levou o próprio Cristo, na incarnação, a sujeitar-se às condições sociais e culturais dos homens com quem conviveu.

Art. 1


O TESTEMUNHO CRISTÃO

Testemunho de vida e diálogo


11. A Igreja tem de estar presente a estes agrupamentos humanos por meio dos seus filhos que entre eles vivem ou a. eles são enviados. Com efeito, todos os fiéis cristãos, onde quer que vivam, têm obrigação de manifestar, pelo exemplo da vida e pelo testemunho da palavra, o homem novo de que se revestiram pelo Baptismo, e a virtude do Espírito Santo por quem na Confirmação foram robustecidos, de tal modo que os demais homens, ao verem as suas boas obras, glorifiquem o Pai (1) e compreendam, mais plenamente o sentido genuíno da vida humana e o vínculo universal da comunidade humana.
Para poderem dar frutuosamente este testemunho de Cristo, unam-se a esses homens com estima e caridade, considerem-se a si mesmos como membros dos agrupamentos humanos em que vivem, e participem na vida cultural e social através dos vários intercâmbios e problemas da vida humana; familiarizem-se com as suas tradições nacionais e religiosas; façam assomar à luz, com alegria e respeito, as sementes do Verbo neles adormecidas; mas atendam, ao mesmo tempo, à transformação profunda que se opera entre os povos e trabalhem por que os homens do nosso tempo não dêem tanta importância à ciência e tecnologia do mundo moderno que se alheiem das coisas divinas, mas, antes pelo contrário, despertem para um desejo mais profundo da verdade e da caridade reveladas por Deus. Assim como o próprio Cristo perscrutou o coração dos homens e por meio da sua conversação verdadeiramente humana os conduziu à luz divina, assim os seus discípulos, profundamente imbuídos do Espírito de Cristo, tomem conhecimento dos homens no meio dos quais vivem, e conversem com eles, para que, através dum diálogo sincero e paciente, eles aprendam as riquezas que Deus liberalmente outorgou aos povos; mas esforcem-se também por iluminar estas riquezas com a luz evangélica, por libertá-las e restituí-las ao domínio de Deus Salvador.


Presença da caridade


12. A presença dos cristãos nos agrupamentos humanos seja animada daquela caridade com que Deus nos amou, e com a qual quer que também nós nos amemos uns aos outros (2).
Efectivamente, a caridade cristã a todos se estende sem discriminação de raça, condição social ou religião; não espera qualquer lucro ou agradecimento. Portanto, assim como Deus nos amou com um amor gratuito, assim também os fiéis, pela sua caridade, sejam solícitos pelos homens, amando-os com o mesmo zelo com que Deus veio procurá-los. E assim como Cristo percorria todas as cidades e aldeias, curando todas as doenças e todas as enfermidades, proclamando o advento do reino e Deus (3), do mesmo modo a Igreja, por meio dos seus filhos, estabelece relações com os homens de qualquer condição, de modo especial cm os pobres e aflitos, e de bom grado por eles gasta as forças (4). Participa nas suas alegrias e dores, conhece as suas aspirações e os problemas da sua vida e sofre com eles nas ansiedades da morte, trazendo-lhes a paz e a luz do Evangelho.
Trabalhem e colaborem os cristãos com todos os outros na recta ordenação dos problemas económicas e sociais. Dediquem-se, com cuidado especial, à educação das crianças e da juventude por meio das várias espécies de escolas, as quais hão-de ser consideradas não só como meio exímio de formação e promoção da juventude cristã, mas também, simultâneamente, como serviço da maior importância para os homens, e em particular para as nações em vias de desenvolvimento, a fim de elevar a dignidade do homem e preparar condições de vida mais humanas. Além disso, tomem parte nos esforços dos povos que, lutando contra a fome, a ignorância e a doença, se afadigam por melhorar as condições de vida e por assegurar a paz no mundo. Nesta actividade prestem os fiéis, com prudência, a sua colaboração efectiva às iniciativas promovidas pelas instituições particulares e públicas, pelos governos, pelos organismos internacionais, pelas diversas comunidades cristãs e religiões não-cristãs.
A Igreja, porém, não quer, de maneira nenhuma, imiscuir-se no governo da cidade terrena. Nenhuma outra autoridade reclama para si senão a de, com a ajuda de Deus, estar ao serviço dos homens pela caridade e pelo serviço fiel (5).
Intimamente unidos com os homens na vida e no trabalho, os discípulos de Cristo esperam oferecer-lhes o verdadeiro testemunho de Cristo e trabalhar na salvação deles, mesmo quando não podem anunciar plenamente a Cristo. Porque não procuram o progresso e a prosperidade material dos homens, mas promovem a sua dignidade e fraterna união, ensinando as verdades religiosas e morais, que Cristo esclareceu com a Sua luz. Deste modo, vão abrindo pouco a pouco o acesso mais pleno a Deus. Assim, os homens são auxiliados na aquisição da salvação pela caridade para com Deus e para com o próximo, e começa a brilhar o mistério de Cristo, no qual apareceu o homem novo que foi criado segundo Deus, (cfr. Ef. 4,24), e no qual se revela a caridade divina.


Art. 2


A PREGAÇÃO DO EVANGELHO E A REUNIÃO DO POVO DE DEUS


Evangelização e conversão


13. Sempre que Deus abre a porta da palavra para anunciar o mistério de Cristo (7) a todos os homens (8), com confiança e constância (9) seja anunciado (10) o Deus vivo, e Aquele que Ele enviou para a salvação de todos, Jesus Cristo(11), para que os não-cristãos, sob a inspiração interior do Espírito Santo (12), se convertam livremente à fé no Senhor, e adiram sinceramente Aquele que, sendo «caminho, verdade e vida» (Jo. 14,6), cumula todas as suas esperanças espirituais, mais ainda, supera-as infinitamente. Esta conversão há-de considerar-se como inicial, mas suficiente para o homem cair na conta de que, arrancado ao pecado, é introduzido no mistério do amor de Deus, que o chama a entabular relações pessoais consigo em Cristo. Pois, sob a acção da graça de Deus, o neo-convertido inicia o caminho espiritual pelo qual, comungando já pela fé no mistério da morte e ressurreição, passa do homem velho ao homem novo que tem em Cristo a sua perfeita realização (13).
Esta passagem, que traz consigo uma mudança progressiva de mentalidade e de costumes, deve manifestar-se e desenvolver-se, com as suas consequências sociais, durante o tempo do catecumenado. Porque o Senhor em que acreditamos, é sinal de contradição (14), o homem convertido experimenta frequentemente rupturas e separações, mas também alegrias que Deus concede sem medida (15). A Igreja proíbe severamente obrigar quem quer que seja a abraçar a fé, ou induzi-lo e atraí-lo com processos indiscretos, do mesmo modo que reclama com vigor o direito de ninguém ser afastado da fé por meio de vexações iníquas (16).
Em conformidade com o antiquíssimo costume da Igreja, investiguem-se os motivos da conversão e, se for necessário, purifiquem-se.


Catecumenado e iniciação cristã


14. Aqueles que receberam de Deus por meio da Igreja a fé em Cristo (17), sejam admitidos ao catecumenado, mediante a celebração de cerimónias litúrgicas; o catecumenado não é mera exposição de dogmas e preceitos, mas uma formação e uma aprendizagem de toda a vida cristã; j prolongada de modo conveniente, por cujo meio os discípulos se unem comi Cristo seu mestre. Por conseguinte, sejam os catecúmenos conveniente: mente iniciados no mistério da salvação, na prática dos costumes evangélicos, e com ritos sagrados, a celebrar em tempo sucessivos (18), sejam introduzidos na vida da fé, da liturgia e da caridade do Povo de Deus.
Em seguida, libertos do poder das trevas pelos sacramentos da iniciação cristã (19), mortos com Cristo e com Ele sepultados e ressuscitados (20) recebem o Espírito (21) de adopção de filhos e celebram com todo o Povo de Deus o memorial da morte e ressurreição do Senhor.
É de desejar que a liturgia do tempo quaresmal e pascal seja reformada de maneira a preparar os corações dos catecúmenos para a celebração do mistério pascal, durante cujas solenidades eles são regenerados para Cristo pelo Baptismo.
Esta iniciação cristã realizada no catecumenado deve ser obra não apenas dos catequistas ou sacerdotes, mas de toda a comunidade dos fiéis, especialmente dos padrinhos, de forma que desde o começo os catecúmenos sintam que pertencem ao Povo de Deus. Visto que a vida da Igreja é apostólica, os catecúmenos devem igualmente aprender a cooperar activamente; pelo testemunho da sua vida e a profissão da sua fé, na evangelização e na construção da Igreja.
Enfim, o estado jurídico dos catecúmenos deve ser fixado claramente no novo Código. Pois eles estão já unidos à Igreja (22), já são da casa de Cristo (23), e, não raro, eles levam já uma vida de fé, de esperança e de caridade.

Art. 3


A FORMAÇÃO DA COMUNIDADE CRISTÃ


Formação da comunidade cristã


15. O Espírito Santo, que chama todos os homens a Cristo pelas sementes do Verbo e pela pregação do Evangelho e suscita nos corações a homenagem da fé, quando gera no seio da fonte baptismal para uma nova vida os que crêem em Cristo, reune-os num só Povo de Deus que é graça escolhida, sacerdócio real, nação santa, povo adquirido»
Portanto, os missionários, colaboradores de Deus (25), devem fazer nascer comunidades de fiéis que, levando uma vida digna da vocação que receberam (26), sejam tais que possam exercer as funções a elas confiadas por Deus: sacerdotal, profética e real. E deste modo que uma comunidade cristã se torna sinal da presença de Deus no mundo: pelo sacrifício eucarístico, com efeito, passa incessantemente com Cristo ao Pai (27), alimentada cuidadosamente pela palavra de Deus (28) dá testemunho de Cristo (29), caminha, enfim, na caridade e arde em espírito apostólico (30).
Uma comunidade cristã deve ser constituída desde o começo de tal maneira que possa, na medida do possível, prover por si mesma às suas necessidades. Esta comunidade de fiéis, dotada das riquezas culturais da sua própria nação, deve estar profundamente enraizada no povo: devem desabrochar as famílias penetradas do espírito evangélico (31) e ajudadas por escolas idóneas; devem organizar-se associações e agrupamentos por meio dos quais o apostolado dos leigos possa penetrar do espírito evangélico toda a sociedade. A caridade deve brilhar, enfim, entre os católicos de rito diferente (32).
Deve também nutrir-se entre os néofitos o espírito ecuménico, pensando justamente que os irmãos que crêem em Cristo são discípulos de Cristo, regenerados pelo Baptismo, participantes de numerosos bens do Povo de Deus. Quanto o permitirem as condições religiosas, deve promover-se a acção ecuménica, de sorte que, banindo toda a aparência de indiferentismo, de confusionismo e odiosa rivalidade, os católicos colaborem com os irmãos separados, em conformidade com as disposições do decreto sobre o Ecumenismo, por meio da comum profissão de fé em Deus e em Jesus Cristo diante dos gentios, na medida do possível, e pela cooperação em questões sociais e técnicas, culturais e religiosas. Colaborem, sobretudo, por amor de Cristo, seu Senhor comum: que o Seu nome os una! Esta colaboração deve ser estabelecida não sòmente entre os indivíduos, mas também, a juízo do Ordinário do lugar, entre igrejas ou comunidades eclesiais e as suas obras.
Os cristãos, provenientes de todos os povos e reunidos em Igreja, «não se distinguem dos outros homens nem pelo país, nem pela língua, nem pela organização política» (33); devem, por isso, viver para Deus e para Cristo segundo os usos do seu próprio povo; cultivem verdadeira e eficazmente, como bons cidadãos, o amor da pátria, mas evitem absolutamente o desprezo pelas outras raças, o nacionalismo exagerado, e promovam o amor universal dos homens.
Para conseguir estes resultados, têm grandíssima importância e são dignos de um interesse particular os leigos, isto é, os fiéis cristãos que, incorporados em Cristo pelo Baptismo, vivem no mundo. A eles pertence, depois de penetrados do Espírito de Cristo, animar interiormente, à maneira de fermento, as realidades temporais e dispô-las para que se realizem sempre segundo Cristo (34).
Não basta, porém, que o povo cristão esteja presente e estabelecido num país; não basta também que ele exerça o apostolado do exemplo; está estabelecido, está presente com esta finalidade: anunciar Cristo aos seus concidadãos não-cristãos pela palavra e pela acção, e ajudá-los a receber plenamente a Cristo.
Ora bem: para a implantação da Igreja e para o desenvolvimento da comunidade cristã, são necessários ministérios diversos, que, suscitados pelo apelo divino no seio da mesma comunidade dos fiéis, devem ser encorajados e cultivados por todos com diligente cuidado; entre estes ministérios, há as funções dos sacerdotes, dos diáconos e dos catequistas, e a acção católica. De modo análogo, os religiosos e as religiosas desempenham, quer pela oração quer pela acção, um serviço indispensável para enraizar nos corações o reino de Cristo, fortificá-lo e estendê-lo mais ao longe.


Constituição do clero local


16. Com imensa alegria, a Igreja dá graças pelo dom inapreciável da vocação sacerdotal que Deus concedeu a tão avultado número de jovens entre os povos recentemente convertidos a Cristo. A Igreja, efectivamente, lança raízes mais vigorosas em cada agrupamento humano, quando as várias comunidades de fiéis tiram dentre os seus membros os próprios ministros da salvação na ordem dos Bispos, dos presbíteros e dos diáconos, que servem os seus irmãos, de tal sorte que as jovens igrejas adquirem a pouco e pouco a estrutura diocesana com clero próprio.
Aquilo que foi decidido por este Concílio a propósito da vocação e da formação sacerdotal, observe-se religiosamente nos lugares em que a Igreja começa a implantar-se e também nas novas igrejas. Preste-se muita atenção ao que foi dito sobre a formação espiritual intimamente unida à formação doutrinal e pastoral da vida vivida segundo o espírito do Evangelho, sem consideração de vantagem pessoal ou interesse familiar, e sobre a formação do sentido íntimo do mistério da Igreja. Assim aprenderão de maneira maravilhosa a consagrar-se inteiramente ao serviço do corpo de Cristo e à obra do Evangelho, a aderir ao próprio Bispo como fiéis colaboradores e a prestar leal colaboração aos seus irmãos (35).
Para conseguir este fim geral, toda a formação dos alunos deve ser orientada à luz do mistério da salvação, como vem exposto na Escritura. Descubram e vivam este mistério de Cristo e da salvação dos homens presente na Liturgia (36).
Estas exigências comuns da formação sacerdotal, que é também pastoral e prática, devem harmonizar-se, segundo as disposições do Concílio (37), com o desejo de ir ao encontro do modo particular de pensar e de agir da sua própria nação. Os espíritos dos alunos devem, pois, abrir-se e cultivar-se para bem conhecerem e poderem apreciar a cultura do seu país; nas disciplinas filosóficas e teológicas, devem tomar conhecimento das relações que há entre as tradições e as religiões nacionais e a religião cristã (38). Do mesmo modo, a formação sacerdotal deve ter em vista as necessidades pastorais da região: os alunos devem aprender a história, a finalidade e o método da acção missionária da Igreja, e as condições particulares, sociais, económicas e culturais do seu próprio povo. Devem ser educados no espírito de ecumenismo e convenientemente preparados para o diálogo fraterno com os não-cristãos (39). Tudo isto pede que os estudos para o sacerdócio sejam realizados, quanto possível, em ligação contínua e convivência com a gente do próprio país (40). Procure-se enfim, dar, uma formação que prepare para a ordenada administração eclesiástica, e até mesmo a económica.
Dever-se-á também escolher sacerdotes capazes que, depois de alguma experiência pastoral, realizem estudos superiores em Universidades, mesmo estrangeiras, sobretudo em Roma, e em outros Institutos científicos, de sorte que as igrejas jovens tenham à sua disposição sacerdotes do clero local, dotados de ciência e experiência convenientes, para desempenharem as funções eclesiásticas de maior responsabilidade.
Nos lugares em que as Conferências episcopais julgarem oportuno, restabeleça-se a ordem do diaconado como estado de vida permanente, em conformidade com as normas da Constituição sobre a Igreja (41). É útil, com efeito, que para exercer um ministério verdadeiramente diaconal, quer pregando a palavra de Deus como catequistas, quer dirigindo em nome do pároco e do Bispo comunidades cristãs dispersas, quer exercendo a caridade em obras sociais ou caritativas, sejam fortificados pela imposição das mãos, transmitida desde o tempo dos Apóstolos, e mais estreitamente unidos ao altar, para que desempenhem o seu ministério mais eficazmente, por meio da graça sacramental do diaconado.


Formação dos catequistas


17. De modo semelhante, é digno de elogio aquele exército com tantos méritos na obra das missões entre pagãos, o exército dos catequistas, homens e mulheres, que, cheios do espírito apostólico, prestam com grandes trabalhos uma ajuda singular e absolutamente necessária à expansão da fé e da Igreja.
Hoje em dia, em razão da escassez de clero para evangelizar tão grandes multidões e exercer o ministério pastoral, o ofício dos catequistas tem muitíssima importância. A sua formação deve, portanto, fazer-se de maneira tão acomodada ao progresso cultural, que eles possam desempenhar o mais perfeitamente possível o seu múnus como colaboradores eficazes da ordem sacerdotal, múnus esse que se vai complicando com novas e maiores obrigações.
É preciso, portanto, multiplicar as escolas diocesanas e regionais, nas quais os futuros catequistas estudem cuidadosamente a doutrina católica, sobretudo em matéria bíblica e litúrgica, assim como o método catequético e a prática pastoral, e se formem na moral cristã (42), exercitando-se sem desfalecimentos na piedade e na santidade de vida. Além disso, devem organizar-se reuniões ou cursos de actualização nas disciplinas e nas artes úteis ao seu ministério, e de renovação e robustecimento da sua vida espiritual. Por outro lado, aos que se dedicam inteiramente a esta ocupação, dever-se-á proporcionar, por uma justa remuneração, conveniente nível de vida e segurança social (43).
É de desejar que se proveja, de maneira conveniente, à formação e sustentação dos catequistas, por meio de subsídios especiais da sagrada Congregação de «Propaganda Fide». Parecendo necessário e conveniente, funde-se uma Obra para os catequistas.
Além disso, as igrejas serão reconhecidas ao trabalho generoso dos catequistas auxiliares, cuja ajuda lhes será indispensável. São eles que presidem às orações nas comunidades e ensinam a doutrina. É preciso, pois, tratar da sua conveniente formação doutrinal e espiritual. Por outro lado, é de desejar que, onde parecer oportuno, seja confiada pùblicamente, durante a celebração duma acção litúrgica, a missão canónica aos catequistas que tiverem recebido a devida formação, a fim de. estarem com maior autoridade ao serviço da fé junto do povo.


Promoção da vida religiosa


18. Desde o período da implantação da Igreja, deve ter-se o cuidado de promover a vida religiosa; esta não sòmente presta ajuda preciosa e absolutamente necessária à actividade missionária, mas, por uma consagração mais íntima feita a Deus na Igreja, manifesta e significa com esplendor também a natureza íntima da vocação cristã. (44)
Os Institutos religiosos que trabalham na implantação da Igreja, profundamente impregnados das riquezas místicas que são a glória da tradição religiosa da Igreja, devem esforçar-se por as exprimir e as transmitir, segundo o génio e carácter de cada povo. Devem examinar como é que as tradições ascéticas e contemplativas, cujos germes foram, algumas vezes, espalhados por Deus nas civilizações antigas, antes da pregação do Evangelho, podem ser assumidas pela vida religiosa cristã.
Devem cultivar-se nas igrejas jovens as diversas formas de vida religiosa para que mostrem os diversos aspectos da missão de Cristo e da vida da Igreja, e se dediquem às várias obras pastorais, e preparem convenientemente os seus membros para as desempenhar. No entanto, procurem os Bispos nas Conferências que não se multipliquem Congregações com o mesmo fim apostólico, com prejuízo da vida religiosa e do apostolado.
São dignas de menção especial as diversas iniciativas em vista ao enraizamento da vida contemplativa; certos Institutos, guardando os elementos essenciais da instituição monástica, trabalham por implantar a riquíssima tradição da sua Ordem; outros voltam às formas mais simples do monaquismo antigo. Todos, no entanto, devem procurar uma autêntica adaptação às condições locais. Uma vez que a vida contemplativa pertence à plenitude da presença da Igreja, é preciso que ela seja instaurada por toda a parte nas novas igrejas.


CAPÍTULO III


AS IGREJAS PARTICULARES


Incremento das Igrejas jovens


19. A obra de implantação da Igreja num determinado agrupamento humano atinge em certa medida o seu termo, quando a comunidade dos fiéis, enraizada já na vida social e adaptada à cultura local, goza de alguma estabilidade e firmeza: com recursos próprios, ainda que insuficientes, de clero local, de religiosos e de leigos; possui já os ministérios e instituições necessárias para viver e desenvolver a vida do Povo de Deus, sob a orientação do próprio Bispo.
Nestas igrejas jovens, a vida do Povo de Deus deve adquirir a maturidade em todos os sectores da vida cristã, renovada segundo as normas deste Concílio: os grupos de fiéis tornam-se de dia para dia mais conscientemente comunidades de fé, de liturgia e de caridade; pela sua actividade cívica e apostólica, os leigos trabalham por instaurar na sociedade uma ordem de caridade e de justiça; os meios de comuniçação social são empregados de maneira oportuna e prudente; graças a uma vida verdadeiramente cristã, as famílias tornam-se viveiros do apostolado dos leigos e das vocações sacerdotais e religiosas. A fé, enfim, é ensinada por meio duma catequese adaptada, é celebrada numa liturgia conforme ao génio do povo, e, por uma legislação canónica conveniente, passa para as instituições e para os costumes locais.
Os Bispos, cada um com o seu presbitério, cada vez mais penetrados do sentido de Cristo e da Igreja, devem sentir e viver com a Igreja universal. Deve manter-se íntima a comunhão das igrejas jovens com a Igreja inteira, cujos elementos tradicionais elas devem juntar à sua cultura própria, para fazer crescer a vida do Corpo místico por meio de trocas mútuas(1). Por isso, devem cultivar-se os elementos teológicos, psicológicos e humanos que podem contribuir para fomentar este sentido de comunhão com a Igreja universal.
Estas igrejas, porém, não raro situadas nas regiões mais pobres do globo, vêem-se ainda a braços com insuficiência, ordinàriamente muito grave, de sacerdotes, e com falta de recursos materiais. Por isso, têm muitíssima necessidade de que a acção missionária continuada da Igreja inteira lhes subministre os socorros que sirvam, antes de mais, para o desenvolvimento da igreja local e para a maturidade da vida cristã. Esta acção missionária deve atender também às igrejas fundadas há longa data que se encontram em estado de retrocesso ou decadência.
Estas igrejas, todavia, devem renovar o seu zelo pastoral comum e as obras oportunas para aumentar em número, discernir com mais segurança e cultivar com mais eficácia as vocações para o clero diocesano e para os Institutos religiosos (2), de maneira que, pouco a pouco, possam prover às suas próprias necessidades e auxiliar as outras.


A sua actividade missionária


20. A igreja particular, pela obrigação que tem de representar o mais perfeitamente possível a Igreja universal, deve ter consciência que foi também enviada aos habitantes do mesmo território que não crêem em Cristo, a fim de ser, pelo testemunho da vida de cada um dos fiéis e de toda a comunidade, um sinal a mostrar-lhes Cristo.
Além disso, para o Evangelho chegar a todos, é indispensável o ministério da palavra. É preciso que o Bispo seja, antes de mais, um pregador da fé, que conduza a Cristo novos discípulos (3). Para se desempenhar, como convém, desta nobre incumbência, deve conhecer bem a situação do seu rebanho, as opiniões íntimas dos seus concidadãos a respeito de Deus, tomando cuidadosamente em linha de conta as mudanças introduzidas pela urbanização, migração e indiferentismo religioso.
Nas igrejas jovens, os sacerdotes nativos empreendam com ardor a obra da evangelização, organizando uma acção comum com os missionários estrangeiros, com os quais formam um presbitério único, unido debaixo da autoridade do Bispo, não só para apascentar os fiéis e celebrar o culto divino, mas também para pregar o Evangelho àqueles que estão fora. Eles devem mostrar-se prontos e, havendo ocasião, oferecer-se com fervor ao Bispo para empreender o trabalho missionário nas regiões afastadas e abandonadas da sua própria diocese, ou em outras dioceses.
Do mesmo zelo em relação aos seus concidadãos, sobretudo os mais pobres, devem sentir-se animados os religiosos e as religiosas, bem como os leigos.
As Conferências episcopais procurem organizar, em tempos. determinados, cursos de renovação bíblica, teológica, espiritual e pastoral, para que, na variedade e mudança de situações, o clero adquira um conhecimento mais pleno da ciência teológica e dos métodos pastorais.
Quanto ao mais, observe-se religiosamente o que este Concílio determinou, especialmente no decreto sobre o ministério e a vida dos sacerdotes.
Para que esta obra missionária duma igreja particular possa ser levada a bom termo, é necessário que haja ministros capazes, oportunamente preparados em conformidade com o condicionalismo de cada igreja. Uma vez que os homens se reúnem cada vez mais em grupos, convém absolutamente que as Conferências episcopais tenham planos comuns sobre . o diálogo a instituir com esses grupos. Se em certas regiões se encontram grupos de homens, que são impedidos de abraçar a fé católica pelo facto de não poderem adaptar-se à forma particular que a Igreja aí tenha revestido, é de desejar que se proveja de maneira especial a essa situação (4), até que todos os cristãos possam ser congregados numa só comunidade. Os Bispos devem chamar para as suas dioceses ou receber de boa vontade os missionários de que a Sé Apostólica puder dispor para esta finalidade, e favorecer eficazmente as suas iniciativas.
Para que este zelo missionário comece a florescer entre os naturais do país, convém absolutamente que as igrejas jovens participem efectivamente na missão universal da Igreja, enviando elas também missionários a anunciar o Evangelho por toda a terra, ainda que elas sofram de falta de clero. A comunhão com a Igreja inteira estará, de certo modo, consumada quando, também elas, tomarem parte activa na acção missionária junto de outros povos.


Promoção do apostolado dos leigos


21. A Igreja não está fundada verdadeiramente, nem vive plenamente, nem é o sinal perfeito de Cristo entre os homens se, com a Hierarquia, não existe e trabalha um laicado autêntico. De facto, sem a presença activa dos leigos, o Evangelho não pode gravar-se profundamente nos espíritos, na vida e no trabalho de um povo. Por isso, é necessário desde a fundação da Igreja prestar grande atenção à formação dum laicado cristão amadurecido.
Os leigos pertencem, ao mesmo tempo, ao Povo de Deus e à sociedade civil: pertencem, por um lado, à nação em que nasceram, de cujos tesouros culturais participam pela educação, a cuja vida estão ligados por múltiplos laços sociais, para cujo progresso cooperam com o seu esforço nas suas profissões, cujos problemas sentem e procuram resolver como próprios; pertencem também a Cristo, porque foram regenerados na Igreja pela fé e pelo Baptismo, a fim de serem de Cristo(5) pela renovação da vida e acção, para que em Cristo tudo seja submetido a Deus, e, enfim, Deus seja tudo em todos (6).
O principal dever deles, homens e mulheres, é o testemunho de Cristo, que eles têm obrigação de dar, pela sua vida e palavras, na família, no grupo social, no meio profissional. É necessário que se manifeste neles o homem novo criado segundo Deus em justiça e santidade verdadeira (7). Devem exprimir esta novidade de vida no meio social e cultural da sua pátria, em conformidade com as tradições nacionais. Devem conhecer esta cultura, purificá-la, conservá-la, desenvolvê-la segundo as novas situações, enfim, dar-lhe a sua perfeição em Cristo, a fim que a fé em Cristo e a vida da Igreja deixem de ser estranhas à sociedade em que vivem mas comecem a penetrá-la e a transformá-la. Devem unir-se aos seus concidadãos com caridade sincera, a fim de que no seu comportamento apareça um novo laço de unidade e de solidariedade universal, haurida no mistério de Cristo. Devem transmitir a fé em Cristo também àqueles a quem estão ligados pela vida e profissão; esta obrigação impõe-se tanto mais quanto a maior parte dos homens não podem ouvir o Evangelho e conhecer a Cristo senão pelos seus vizinhos leigos. Mais ainda: onde for possível, devem os leigos estar prontos a cumprir, em colaboração mais imediata com a Hierarquia, a missão especial de anunciar o Evangelho e comunicar a doutrina cristã, a fim de tornarem mais vigorosa a Igreja nascente.
Os ministros da Igreja, por sua vez, devem ter em muito apreço o apostolado activo dos leigos. Devem formá-los para, como membros de Cristo, tomarem consciência da sua responsabilidade em relação aos outros homens; devem instruí-los profundamente no mistério de Cristo, iniciá-los nos métodos práticos, assistir-lhes nas dificuldades, em conformidade com o pensamento da Constituição sobre a Igreja e do decreto sobre o Apostolado dos leigos.
Bem respeitadas as funções e as responsabilidades próprias dos pastores e dos leigos, a jovem igreja toda inteira deve dar um único testemunho vivo e firme de Cristo, a fim de se tornar um sinal luminoso da salvação que em Cristo veio até nós.


Diversidade na Unidade


22. A semente da palavra de Deus, germinando em boa terra, regada pelo orvalho divino, absorve a seiva, transforma-a e assimila-a para produzir fruto abundante. Certamente, de modo análogo à economia da encarnação, as igrejas jovens, enraizadas em Cristo e construídas sobre o fundamento dos Apóstolos, recebem, por um maravilhoso intercâmbio, todas as riquezas das nações que foram dadas a Cristo em heranças. Recebem dos costumes e das tradições dos seus povos, da sabedoria e da doutrina, das artes e das disciplinas, tudo aquilo que pode contribuir para confessar a glória do criador, ilustrar a graça do Salvador, e ordenar, como convém, a vida cristã (9).
Para conseguir este objectivo, é necessário que em cada grande espaço socio-cultural, se estimule uma reflexão teológica tal que, à luz da tradição da Igreja universal, as acções e as palavras reveladas por Deus, consignadas na Sagrada Escritura, e explicadas pelos Padres da Igreja e pelo magistério, sejam sempre de novo investigadas. Assim se entenderá mais claramente o processo de tornar a fé inteligível, tendo em conta a filosofia ou a sabedoria dos povos, e a maneira de os costumes, o sentido da vida e a ordem social poderem concordar com a moral manifestada pela revelação divina. Deste modo se descobrirá o caminho para uma mais profunda adaptação em toda a extensão da vida cristã. Toda a aparência de sincretismo e de falso particularismo, será assim excluída, a vida cristã conformar-se-á bem ao génio de cada cultura (10), as tradições particulares e qualidades próprias de cada nação, esclarecidas pela luz do Evangelho, serão assumidas na unidade católica. Enfim, as novas igrejas particulares, enriquecidas pelas suas tradições, terão o seu lugar na comunhão eclesiástica, ficando intacto o primado da cátedra de Pedro, que preside a toda a assembleia da caridade (11).
É, portanto, de desejar, ou antes, convém absolutamente que as Conferências episcopais, dentro dos limites de cada grande espaço socio-cultural, se unam entre si para, de ânimo concorde e pondo em comum os seus planos, conseguirem este objectivo da adaptação.


CAPÍTULO IV


OS MISSIONÁRIOS


A vocação missionária


23. Embora a todo o discípulo de Cristo incumba a obrigação de difundir a fé conforme as suas possibilidades(1), Cristo Senhor chama sempre dentre os discípulos os que Ele quer para estarem com Ele e os enviar a evangelizar os povos (2). E assim, mediante o Espírito Santo, que para utilidade comum reparte os carismas como quer (3), inspira no coração de cada um a vocação missionária e ao mesmo tempo suscita na Igreja Institutos (4), que assumem, como tarefa própria, o dever de evangelizar, que pertence a toda a Igreja.
De facto, são marcados com vocação especial aqueles que, dotados de índole natural conveniente e das qualidades e talentos requeridos, estão prontos para empreender o trabalho missionário (5), quer sejam nativos quer estrangeiros: sacerdotes, religiosos e leigos. Enviados pela legítima autoridade, partem, movidos pela fé e obediência, para junto dos que estão longe de Cristo, escolhidos para uma obra à qual foram destinados (6) como ministros do Evangelho, «a fim de que a oblação dos gentios seja aceite e santificada no Espírito Santo» (Rom. 15,16).


Espiritualidade missionária


24. Porém, ao chamamento de Deus, o homem deve responder de forma tal que, sem se deixar guiar pela carne e sangue(7), todo ele se entregue à obra do Evangelho. Mas esta resposta não pode ser dada senão por impulso e virtude do Espírito Santo. O enviado entra, portanto, na vida e missão d'Aquele que «a si mesmo se aniquilou tomando a forma de servo» (Fil. 2,7). Por conseguinte, deve estar pronto a perseverar toda a vida na vocação, a renunciar a si e a todas as suas coisas, e a fazer-se tudo para todos (8).
Anunciando o Evangelho aos povos, dê a conhecer confiadamente o mistério de Cristo, do qual é legado, de maneira que ouse falar d'Ele como convém (9), não se envergonhando do escândalo da cruz. Seguindo os passos do seu mestre, manso e humilde de coração, mostre que o Seu jugo é suave e leve a Sua carga (10). Mediante uma vida verdadeiramente evangélica (11), com muita paciência, longanimidade, suavidade, caridade sincera (12), dê testemunho do seu Senhor até à efusão do sangue, se for necessário. Alcançará de Deus virtude e força para descobrir a abundância de gozo que se encerra na grande prova da tribulação e da pobreza absoluta (13).
Persuada-se que a obediência é a virtude peculiar do ministro de Cristo que, pela Sua obediência, redimiu o género humano.
Os pregadores do Evangelho, para não negligenciar a graça que em si têm, renovem continuamente o seu espírito (14). Por sua vez, os Ordinários e os Superiores reunam os missionários em tempos determinados, a fim d.e mais se robustecerem na esperança da vocação e se renovarem no ministério apostólico, fundando até, para isso, casas apropriadas.


Formação espiritual e moral


25. Para tão sublime empresa, há-de o futuro missionário preparar-se com esmerada formação espiritual e moral (15). Deve, com efeito, ser capaz de tomar iniciativas, constante para levar a cabo as obras, perseverante nas dificuldades, suportando com paciência e fortaleza a solidão, a fadiga, o trabalho infrutuoso. Com espírito aberto e coração dilatado, irá ao encontro dos homens; abraçará de boa vontade os trabalhos que lhe confiarem; adaptar-se-á também generosamente aos diversos costumes e variadas condições dos povos; com ânimo concorde e mútua caridade colaborará com seus irmãos e com todos quantos se consagram à mesma empresa, de maneira que, juntamente com os fiéis, imitando a comunidade apostólica, tenham um só coração e uma só alma (16).
Estas disposições de espírito sejam diligentemente exercitadas, cuidadosamente cultivadas, elevadas e alimentadas com a vida espiritual, já desde o tempo da formação. Cheio de fé viva e esperança indefectível, o missionário seja homem de oração; arda no espírito de fortaleza, de caridade e de temperança (17); aprenda a bastar-se com o que tem (18); pelo espírito de sacrifício, leve em si o estado de morte de Jesus, a fim de que a vida de Jesus opere naqueles aos quais é enviado (19); com verdadeiro zelo gaste tudo e desgaste-se a si mesmo pelo bem das almas (20), de tal forma que «mediante o exercício diário do seu ministério, cresça no amor de Deus e do próximo» (21). Desta sorte, obedecendo com Cristo à vontade do Pai, continuará a Sua missão sob a autoridade hierárquica da Igreja, e cooperará no mistério da salvação.


Formação doutrinal e apostólica


26. Os que forem enviados aos diversos povos, como bons ministros de Cristo, devem ser alimentados «com a palavra da fé e da boa doutrina» (1 Tim. 4,6), a qual haurirão primeiramente na Sagrada Escritura, perscrutando o mistério de Cristo, de quem serão arautos e testemunhas.
E assim, todos os missionários sacerdotes, irmãos, irmãs, leigos sejam preparados e formados, cada qual segundo a sua condição, de maneira a estarem à altura das exigências do trabalho futuro (22). Já desde o começo, de tal modo se processe a sua formação doutrinal, que abranja tanto a universalidade da Igreja como a diversidade das nações. E isto vale tanto de todas as disciplinas, em que se formam para o desempenho do ministério, como das disciplinas úteis para o conhecimento dos povos, das culturas, das religiões, com vistas não só ao passado mas também ao tempo presente. Aquele, pois, que é destinado a outra nação, tenha em grande apreço o seu património, língua e costumes. Ao futuro missionário importa sumamente que se aplique aos estudos missiológicos, isto é, a conhecer a doutrina e as normas da Igreja em matéria de actividade missionária, a informar-se sobre os caminhos percorridos pelos arautos do Evangelho, ao longo dos séculos, como também sobre a condição presente das missões e sobre os métodos considerados hoje mais eficazes (23).
Embora toda a formação deva estar imbuída de solicitude pastoral, ministre-se-lhes, contudo, peculiar e bem orientada formação apostólica, quer teórica quer prática (24).
Forme-se o maior número possível de irmãos e de irmãs em catequética, para darem maior colaboração no apostolado.
Mesmo aqueles que se dedicam só por algum tempo à acção missionária, devem adquirir a formação adequada à sua condição.
Estas diversas espécies de preparação, porém, devem ser completadas nas próprias terras de missão, de modo que os missionários adquiram mais profundo conhecimento da história, das estruturas sociais e dos costumes dos povos, e se inteirem da ordem moral e dos preceitos religiosos, bem como do verdadeiro pensamento que esses povos, conforme suas tradições sagradas, possuem acerca de Deus, do mundo e do homem (25). Quanto às línguas, aprendam-nas de modo a usá-las com facilidade e elegância, e terem, assim, mais fácil acesso à inteligência e ao coração dos homens (26). Finalmente, sejam devidamente iniciados nas necessidades pastorais características da terra.
Haja também pessoal preparado de modo mais profundo em Institutos missiológicos ou noutras Faculdades ou Universidades, que possa desempenhar cargos de maior responsabilidade (27), e, com a sua ciência, auxiliar os outros missionários no exercício da obra evangelizadora, que, na hora actual, apresenta tantas dificuldades e oportunidades. Além disso, é muito para desejar que as Conferências episcopais regionais tenham à sua disposição um bom número destes peritos e que, nas necessidades do próprio cargo, façam proveitoso uso do seu saber e experiência. Nem falte igualmente quem saiba usar com perícia os instrumentos técnicos e de comunicação social, cuja importância todos reconheçam devidamente.


Institutos missionários


27. Tudo isto, embora absolutamente necessário a cada um dos enviados ao campo do apostolado, na realidade, dificilmente pode ser conseguido pelos indivíduos isolados. Visto que a mesma obra missionária, como prova a experiência, não pode ser realizada pelos indivíduos isolados, a vocação comum reuniu-os em Institutos, nos quais, pelo esforço comum, se formassem convenientemente e executassem essa tarefa em nome da Igreja e segundo a vontade da autoridade hierárquica. Os Institutos, desde há muitos séculos que têm suportado o peso do dia e do calor, consagrando-se inteiramente ou em parte à empresa apostólica. Muitas vezes a Santa Sé confiou à sua evangelização vastos territórios, nos quais reuniram para Deus um novo povo, uma igreja local à volta dos seus próprios pastores. A essas igrejas, fundadas à custa do seu suor e até do seu sangue, prestarão serviço com zelo e experiência em fraterna cooperação, já na cura das almas, já em cargos especiais em função do bem comum.
Algumas vezes, tomarão a seu cargo em toda uma região certos trabalhos mais urgentes, como por exemplo, a missionação de grupos ou de povos que, devido a especiais razões, ainda não receberam a boa nova do Evangelho, ou a ela resistiram até ao presente (28).
Se for preciso, dediquem-se a formar e ajudar com a sua experiência aqueles que se consagram por um tempo determinado à acção missionária.
Por todos estes motivos, e porque há ainda numerosas gentes para conduzir a Cristo, os Institutos continuam a ser da máxima necessidade.


CAPÍTULO V


A ORGANIZAÇÃO DA ACTIVIDADE MISSIONÁRIA


Introdução: sua necessidade


28. Os fiéis, em virtude de possuirem dons diferentes (1), devem colaborar no Evangelho, cada um segundo as suas possibilidades, aptidões, carismas e ministérios (2); é ainda necessário que todos, os que semeiam e os que segam (3), sejam um só (4), a fim de que, «conspirando livre e ordenadamente para o mesmo fim» (5), empreguem unânimemente as suas forças na edificação da Igreja.
Por isso, os trabalhos dos arautos do Evangelho e os auxílios dos restantes fiéis devem ser orientados e unidos de modo a que tudo se faça com ordem (1 Cor. 14,40) em todas as actividades e esferas da cooperação missionária.


Organização geral


29. O cuidado de anunciar o Evangelho em todas as partes da terra pertence, antes de mais, ao corpo episcopal (6); por isso, o Sínodo episcopal ou «Conselho permanente de Bispos para toda a Igreja» (7), entre os assuntos de importância geral (8), deve atender de modo especial à actividade missionária, que é a principal e a mais sagrada da Igreja (9).
Para todas as missões e para toda a actividade missionária, haja um só dicastério competente, a saber, a Congregação de «Propaganda Fide», que orientará e coordenará, em todo o mundo, tanto a actividade como a cooperação missionária, ressalvando-se, contudo, o direito das Igrejas orientais 1°.
Embora o Espírito Santo suscite, de muitos modos, na Igreja de Deus, o espírito missionário, e não poucas vezes se anteceda à acção dos que governam a vida da Igreja, este dicastério, contudo, deve promover, da sua parte, a vocação e a espiritualidade missionária, o zelo e a oração pelas missões, e uma exacta e adequada informação sobre elas. Suscite e distribua os missionários, segundo as necessidades mais urgentes das regiões. Organize um plano de acção; dele promanem as normas directivas, os princípios para a evangelização, e dele procedam os impulsos. Incite e coordene a recolha eficaz de subsídios, que devem distribuir-se segundo a medida da necessidade ou da utilidade, da extensão do território, do número de fiéis e infiéis, das obras e das instituições, dos auxiliares e dos missionários
Em união com o «Secretariado para a união dos cristãos», procure os meios de realizar e ordenar a colaboração fraterna e a convivência com as iniciativas missionárias doutras comunidades cristãs, a fim de se evitar, quanto possível, o escândalo da divisão.
Por isso, importa que este dicastério seja tanto instrumento de administração como órgão de direcção dinâmica, empregando os métodos científicos e os instrumentos adaptados às condições actuais, e tendo em conta a actual investigação da teologia, metodologia e pastoral missionária.
Na direcção deste dicastério, tenham parte muito activa, com voto deliberativo, representantes escolhidos de todos aqueles que trabalham na obra missionária: os Bispos de todo o mundo, depois de ouvidas as Conferências episcopais, e os Superiores dos Institutos e das Obras pontifícias, segundo as normas e proporções que o Romano Pontífice estabelecer. Todos estes, que hão-de ser convocados em datas fixas, exerçam, sob a autoridade do Sumo Pontífice, a suprema orientação de toda a obra missionária.
Esteja à disposição deste dicastério um grupo permanente de consultores peritos, de reconhecida ciência e experiência, aos quais pertence, entre outras coisas, reunir uma informação oportuna sobre as condições locais das várias regiões, a mentalidade dos diferentes grupos humanos, os métodos de evangelização a empregar, e propor conclusões cientificamente fundadas para a cooperação missionária.
Estejam convenientemente representados os Institutos de religiosas, as obras regionais a favor das missões, e as organizações de leigos, sobretudo as internacionais.


Organização local das missões


30. Para que, no exercício da obra missionária, se atinjam os fins e os resultados, devem todos os operários missionários ter um «só coração e uma só alma» (Act. 4,32).
Pertence ao Bispo, como regra e centro de unidade no apostolado diocesano, promover, dirigir e coordenar a actividade missionária, mas de tal modo que se conserve e fomente a iniciativa espontânea dos que participam na obra. Todos os missionários, mesmo os religiosos isentos, estão sob a sua jurisdição nos vários trabalhos que dizem respeito ao exercício do apostolado (11). Para melhor coordenação, constitua o Bispo, na medida do possível, um Conselho pastoral, em que participem, por meio de delegados escolhidos, os clérigos, os religiosos e os leigos. Procure ainda que a acção apostólica não se limite aos convertidos, mas que os operários e os subsídios se destinem equitativamente à evangelização dos não-cristãos.


Organização regional


31. As Conferências episcopais resolvam, de comum acordo, as questões mais graves e os problemas mais urgentes, sem menosprezarem, contudo, as diferenças locais (12). Para não dissipar o número já insuficiente de pessoas e de subsídios e não multpilicar sem necessidade as iniciativas, recomenda-se a fundação de obras comuns que sirvam o bem de todos; por exemplo, seminários, escolas superiores e técnicas, centros de pastoral, catequética, liturgia e dos meios de comunicação social.
Organize-se igualmente uma oportuna cooperação entre as diversas Conferências episcopais.


Actividade dos Institutos missionários


32. E ainda da máxima importância coordenar as actividades exercidas pelos Institutos ou Associações eclesiásticas. Todos eles, seja qual for o seu género, devem secundar o Ordinário do lugar, em tudo o que se relaciona com a actividade missionária. Por isso, aproveitará muito realizar acordos particulares, em que se regulem as relações entre o Ordinário do lugar e o Superior do Instituto.
Quando a um Instituto for confiado um território, o Superior eclesiástico e o Instituto tenham muito a peito orientar tudo para que a nova comunidade cristã se transforme em igreja local, a qual, no momento oportuno, será governada por pastor próprio, com o seu clero.
Ao acabar o encargo do território, surge uma nova condição. Então, as Conferências episcopais e os Institutos, de comum acordo, estabeleçam as normas que hão-de reger as relações entre os Ordinários de lugar e os Institutos (13). Contudo, pertence à Santa Sé estabelecer os princípios gerais, pelos quais se organizarão os acordos regionais ou até particulares.
Os Institutos devem estar prontos a continuar a obra começada, colaborando no ministério ordinário da cura de almas: mas, com o aumento do clero local, deve providenciar-se a que os Institutos, na medida em que for conforme à sua finalidade, se mantenham fiéis à própria diocese, encarregando-se generosamente de obras especiais ou de alguma região.


Coordenação dos Institutos missionários


33. Os diversos Institutos que se dedicam à actividade missionária no mesmo território procurem os processos e os modos de coordenar as suas obras. Serão, portanto, de grande utilidade, as Conferências de religiosos e as Uniões de religiosas, em que participem todos os Institutos da mesma nação ou região. Vejam Conferências o que podem fazer com o esforço comum e mantenham estreitas relações com as Conferências episcopais.
Tudo isto, por igual motivo, convém estendê-lo à colaboração dos Institutos missionários na sua pátria de origem, de modo que mais facilmente e com menos despesas se possam resolver os assuntos e empreendimentos comuns, como, por exemplo, a formação doutrinal dos futuros missionários, os cursos para missionários, as relações para com as autoridades civis ou organismos nacionais e internacionais.


Coordenação dos Institutos científicos


34. Como o recto e ordenado exercício da actividade missionária exige que os operários evangélicos se preparem cientificamente para a sua função, sobretudo para o diálogo com as religiões e culturas não-cristãs, e que sejam ajudados eficazmente na execução, é de desejar que colaborem entre si fraterna e generosamente a favor das missões todos os Institutos científicos que estudam missiologia e outras disciplinas ou artes úteis às missões, como a etnologia e a linguística, a história e a ciência das religiões, a sociologia, a pastoral e outras coisas semelhantes.


CAPÍTULO VI


A COOPERAÇÃO


Introdução. Consciência da responsabilidade


35. Dado que a Igreja é toda ela missionária, e a obra da evangelização é um dever fundamental do Povo de Deus, o sagrado Concílio exorta todos a uma profunda renovação interior, para que tomem viva consciência das próprias responsabilidades na difusão do Evangelho e assumam a parte que lhes compete na obra missionária junto dos gentios.


Dever missionário de todo o povo de Deus


36. Como membros de Cristo vivo e a Ele incorporados e configurados não só pelo Baptismo mas também pela Confirmação e pela Eucaristia, todos os fiéis estão obrigados, por dever, a colaborar no crescimento e na expansão do Seu corpo para o levar a atingir, quanto antes, a sua plenitude(1).
Por isso, todos os filhos da Igreja tenham consciência viva das suas responsabilidades para com o mundo, fomentem em si um espírito verdadeiramente católico, e ponham as suas forças ao serviço da obra da evangelização. Saibam todos, porém, que o primeiro e mais irrecusável contributo para a difusão da fé, é viver profundamente a vida cristã. Pois o seu fervor no serviço de Deus e a sua caridade para com os outros é que hão-de trazer a toda a Igreja o sopro de espírito novo que a fará aparecer como um sinal levantado entre as nações (2), como «luz do mundo» (Mt. 5,14) e «sal da terra» (Mt. 5,13). Este testemunho de vida produzirá mais facilmente o seu efeito, se for dado conjuntamente com as outras comunidades cristãs, segundo as normas do decreto sobre o ecumenismo (3).
Deste espírito renovado brotará espontâneamente a oferta de orações e de obras de penitência a Deus, para que fecunde com a sua graça a acção dos missionários; dele nascerão vocações missionárias e sairão os recursos de que as missões necessitam.
Porém, para que todos e cada um dos fiéis conheçam plenamente o estado actual da Igreja no mundo e oiçam a voz das multidões que clamam: «Vem em nosso auxílio» (4) facilitem-se, até pelos meios modernos de comunicação social, notícias missionárias tais que os façam sensíveis à actividade missionária e lhes abram o coração a tão profundas e imensas necessidades dos homens par lhes poderem valer.
É também necessária uma coordenação das notícias e a cooperação com os organismos nacionais e internacionais.


Dever missionário das comunidades cristãs


37. Como o Povo de Deus vive em comunidades, sobretudo diocesanas e paroquiais, e é nelas que, de certo modo, se torna visível, pertence a estas dar também testemunho de Cristo perante as nações.
A graça da renovação não pode crescer nas comunidades, a não ser que cada uma dilate o campo da sua caridade até aos confins da terra e tenha igual solicitude pelos que são de longe como pelos que são seus próprios membros.
Assim, toda a comunidade reza, coopera e exerce actividade entre os gentios, por meio dos seus filhos a quem Deus escolheu para este importantíssimo encargo.
É muito útil que, contanto que não crie desinteresse pela obra missionária universal, manter relações com os missionários oriundos da própria comunidade ou com determinada paróquia ou diocese das missões, para tornar visível a comunhão entre as comunidades e contribuir para mútua edificação.


Dever missionário dos Bispos


38. Todos os Bispos, como membros do corpo episcopal, sucessor do Colégio apostólico, são consagrados não só em benefício duma diocese mas para salvação de todo o mundo. O mandato de Cristo de pregar o Evangelho a toda a criatura (5) afecta-os, primária e imediatamente a eles, com Pedro e sob Pedro. Daí nascem aquela comunhão e cooperação das igrejas, hoje tão necessárias para levar a cabo a obra da evangelização. Em virtude desta comunhão, cada uma das igrejas leva em si a solicitude por todas as outras, manifestam umas às outras as próprias necessidades, comunicam entre si as suas coisas, pois a dilatação do corpo de Cristo é dever de todo o Colégio episcopal (6).
Na sua diocese, o Bispo, que forma uma só coisa com ela, ao suscitar, promover e dirigir a obra missionária, torna presentes e como que palpáveis o espírito e o ardor missionário do Povo de Deus, de maneira que toda a diocese se torna missionária. É da responsabilidade do Bispo suscitar no seu povo e sobretudo entre os doentes e os oprimidos, almas que ofereçam a Deus, de todo o coração, orações e penitências pela evangelização do mundo; favorecer de bom grado as vocações de jovens e até de clérigos para os Institutos missionários, aceitando reconhecido que Deus escolha alguns para a actividade missionária da Igreja; exortar e ajudar as Congregações diocesanas para que assumam a sua parte nas missões; promover junto dos seus fiéis as obras dos Institutos missionários, mas sobretudo as Obras missionárias pontifícias. Com todo o direito se deve dar o primeiro lugar a estas Obras, uma vez que são meios quer para dar aos católicos um sentido verdadeiramente universal e missionário logo desde a infância, quer para promover colectas eficazes de subsídios para bem de todas as missões segundo as necessidades de cada uma (7).
Como cresce de dia para dia a necessidade de operários na vinha do Senhor e os sacerdotes diocesanos desejam, eles também, ter parte cada vez maior na evangelização do mundo, o sagrado Concílio deseja que os Bispos, ponderando a gravíssima penúria de sacerdotes que impede a evangelização de muitas regiões, enviem, depois da devida preparação, alguns dos seus melhores sacerdotes que se ofereçam para as missões, para as dioceses mais carecidas de clero, com o fim de exercerem aí o ministério missionário em espírito de serviço, pelo menos durante um tempo determinado (8).
Mas, para que a actividade missionária dos Bispos a bem de toda a Igreja se possa exercer mais eficazmente, convém que as Conferências episcopais tomem a direcção de todos os assuntos que dizem respeito a uma ordenada cooperação da própria região.
Nas suas Conferências tratem os Bispos dos sacerdotes do clero diocesano que devem dedicar à evangelização dos gentios; da contribuição fixa que cada diocese, em proporção com os seus recursos, deve oferecer todos os anos para a obra das missões (9); da direcção e organização das formas e dos meios de ajudar directamente as missões; do auxílio e, se for preciso, até da fundação de Institutos missionários e seminários do clero diocesano para as missões; do estreitamento dos laços entre estes Institutos e as dioceses.
Às Conferências episcopais pertence também fundar e promover instituições que fraternalmente recebam e ajudem, com o devido interesse pastoral, os que, por razões de estudo ou de trabalho, emigram das terras de missão. Por eles, com efeito, povos longínquos tornam-se em certo modo vizinhos, e às comunidades cristãs mais antigas oferece-se uma óptima ocasião de dialogar com nações que ainda não ouviram pregar o Evangelho e de lhes mostrar no próprio exercício do amor e da ajuda, o genuíno rosto de Cristo (10).


Dever missionário dos sacerdotes


39. Os sacerdotes representam a pessoa de Cristo e são cooperadores da ordem episcopal, na tríplice função sagrada, que por sua natureza tem relação com a missão da Igreja (11). Entendam, pois, muito bem que a sua vida foi consagrada também ao serviço das missões. Uma vez que pelo seu mesmo ministério que consiste principalmente na Eucaristia, que aperfeiçoa a Igrejaestão em comunhão com Cristo cabeça e trazem os outros a essa comunhão, não podem deixar de sentir quanto falta ainda para o pleno crescimento do corpo e quanto há que fazer, portanto, para que vá crescendo cada vez mais. Organizarão, pois, de tal maneira o trabalho pastoral que contribua para a dilatação do Evangelho entre os não-cristãos.
Os sacerdotes, no trabalho pastoral, farão por excitar e alimentar entre os fiéis o zelo pela evangelização do mundo, instruindo-os com a catequese e a pregação sobre o dever que a Igreja tem de anunciar Cristo aos gentios; persuadindo as famílias cristãs da necessidade e da honra de cultivar as vocações missionárias entre os próprios filhos e filhas; fomentando o fervor missionário entre os jovens das escolas e associações católicas, de maneira a sairem dentre eles futuros arautos do Evangelho. Ensinem os fiéis a orar pelas missões e não tenham vergonha de lhes pedir esmolas, feitos como que mendigos por Cristo e pela salvação das almas (12).
Os professores dos Seminários e Universidades elucidarão os alunos sobre a verdadeira situação do mundo e da Igreja, para que abram os olhos à necessidade duma evangelização mais intensa dos não-cristãos e o seu zelo se acenda. E ao ensinar as questões dogmáticas, bíblicas, morais e históricas, chamem a atenção para os aspectos missionários nelas contidos, para desse modo se ir formando a consciência missionária dos futuros sacerdotes.


Dever missionário dos Institutos


40. Os Institutos religiosos de vida contemplativa e activa tiveram até agora e continuam a ter a maior parte na evangelização do mundo. O sagrado Concílio reconhece gostosamente os seus méritos e dá graças a Deus por tantos esforços prestados à causa da glória de Deus e do serviço das almas e exorta-os a prosseguir incansàvelmente na obra começada, sabendo, como sabem, que a virtude da caridade, que por vocação têm de cultivar com mais perfeição, impele e obriga a um espírito e a um trabalho verdadeiramente católicos (13).
Os Institutos de vida contemplativa, pelas suas orações, penitências e tribulações, têm uma importância máxima na conversão das almas, visto que é Deus quem pelas nossas orações envia operários para a Sua messe (14), abre as almas dos não-cristãos para ouvir o Evangelho (15), e fecunda nos seus corações a palavra da salvação (16). Pede-se até a esses Institutos que fundem casas nas terras de missão como já bastantes fizeram, para que, levando aí uma vida acomodada às genuínas tradições religiosas dos povos, dêem entre os não-cristãos um testemunho brilhante tanto da majestade e da caridade de Deus como da sua união em Cristo.
Por seu lado, os Institutos de vida activa, quer tenham um fim estritamente missionário quer não, examinem sinceramente diante de Deus se podem alargar mais a sua actividade em ordem à expansão do reino de Deus entre os gentios; se podem deixar a outros, certos ministérios, para dedicar às missões as suas forças; se podem começar a ter actividades nas missões, adaptando, se for preciso, as suas Constituições, embora segundo a mente do fundador; se os seus membros participam quanto podem na actividade missionária; se o seu modo de viver é um testemunho do Evangelho adaptado à índole e às condições do povo.
Uma vez que, sob a inspiração do Espírito Santo, crescem de dia para dia na Igreja os Institutos seculares, a sua ajuda, sob a autoridade do Bispo, pode ser a muitos títulos proveitosa para as missões, como sinal duma entrega plena à evangelização do mundo.


Dever missionário dos leigos


41. Os leigos colaboram na obra de evangelização da Igreja e participam da sua missão salvífica (17), ao mesmo tempo como testemunhas e como instrumentos vivos sobretudo se, depois de chamados por Deus, são incorporados pelos Bispos nesta empresa.
Nas terras já cristãs, os leigos concorrem para a obra de evangelização, fomentando em si e nos outros o conhecimento e o amor pelas missões, suscitando vocações na própria família, nas associações católicas e nas escolas, oferecendo auxílios de toda a espécie para que o dom da fé, que eles receberam de graça, possa ser também oferecido a outros.
Nas terras de missão, os leigos, quer estrangeiros quer nativos, exerçam o ensino nas escolas, administrem as coisas temporais, colaborem na actividade paroquial e diocesana, iniciem e promovam as várias formas de apostolado dos leigos, para que os fiéis das igrejas jovens possam assumir quanto antes a sua parte na vida da Igreja (18).
Finalmente, prestem os leigos, de bom grado, colaboração económico-social aos povos em vias de desenvolvimento; essa colaboração será tanto mais de louvar, quanto mais se relaciona com a criação daquelas instituições que atingem as estruturas fundamentais da vida social ou se ordenam à formação daqueles que têm responsabilidade de governo.
São dignos de particular louvor aqueles leigos que nas Universidades ou em Institutos científicos promovem, com as suas investigações históricas ou científico-religiosas, o conhecimento dos povos e das religiões, ajudando assim os pregadores do Evangelho e preparando o diálogo com os não-cristãos.
Colaborem fraternalmente com os outros cristãos, com os não-cristãos, sobretudo com os membros das organizações internacionais, tendo sempre diante dos olhos e preocupação de que «a edificação da cidade terrena se alicerce no Senhor e para Ele se oriente»(19).
Para desempenhar todas estas funções, precisam os leigos da necessária preparação técnica e espiritual, que se deve dar em Institutos a isso destinados, para que a sua vida seja entre os não-cristãos um testemunho de Cristo, segundo a palavra do Apóstolo: «Não deis ocasião de escândalo nem a judeus nem a gentios nem à Igreja de Deus, como também eu em tudo procuro agradar a todos, não buscando a minha própria utilidade, mas a dos outros, a fim de que sejam salvos» (1Cor. 10, 32-33).


CONCLUSÃO


42. Os Padres do Concílio, em união com o Romano Pontífice, sentindo vivamente a obrigação de difundir por toda a parte o reino de. Deus, saudam muito afectuosamente todos os pregadores do Evangelho, sobretudo aqueles que sofrem perseguição pelo nome de Cristo, e associam-se aos seus sofrimentos (20).
Também eles se sentem inflamados do mesmo amor em que Cristo ardia pelos homens. Mas, conscientes de que Deus é quem faz com que o seu reino venha ao mundo, unem as suas preces às de todos os cristãos para que, por intercessão da Virgem Maria, Rainha dos Apóstolos, as nações sejam quanto antes conduzidas ao conhecimento da verdade (21) e a glória de Deus, que resplandece no rosto de Jesus Cristo, comece a brilhar para todos pelo Espírito Santo (22).
                                                  Roma, 7 de Dezembro de 1965
                                                            PAPA PAULO VI

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